Segundo o Banco Mundial, o Brasil é o quarto país do mundo em área agriculturável (WORLDBANK, 2015). Em um levantamento feito em 2017, estima-se que o Brasil perde mais de US$ 14 bilhões, representando 7% da produção agrícola, devido ao ataque de pragas em lavouras. Visando a redução destes índices, pode-se adotar práticas voltas à Agricultura de Precisão para realizar um monitoramento e um manejo ágil e eficaz. Entretanto, métodos usuais em muitas propriedades são laboriosos, lentos, caros e, por vezes, propensos a erros, o que impede atingir metas de desempenho e custo em tempo real.
O Manejo Integrado de Pragas (MIP) é uma técnica que consiste na integração de diferentes ferramentas de controle visando manter as pragas sempre abaixo do nível em que causam danos para as plantações. O controle populacional de pragas pode ser feito por meio de agentes biológicos (controle biológico), uso de defensivos químicos, controle genético (plantas transgênicas), retirada e queima da parte afetada do vegetal, entre outros. O MIP é uma alternativa proposta pela comunidade científica para diminuir o uso de agrotóxicos, que causam a contaminação dos alimentos e do lençol freático quando aplicados indiscriminadamente. Estudos realizados pela Embrapa evidenciaram que a realização do MIP poderia gerar uma economia de R$ 4 bilhões somente na cultura da soja.
A evolução tecnológica permite tornar a agricultura cada vez mais eficiente e produtiva. Imagens de satélites ou imagens capturadas por veículos aéreos não tripulados (VANT), estudos de solo, análises feitas de forma instantânea e automatização de processos são ferramentas que tem colaborado na transformação deste cenário. Neste processo, destaca-se o sensoriamento remoto, que potencializa e agiliza a coletas de dados (que muitas vezes vão além da percepção humana), além de permitir a atuação de forma automática ou remota na execução de tarefas a distância e em tempo real. O sensoriamento remoto fornece um meio inofensivo, rápido e econômico de identificar e quantificar o estresse das culturas devido a diferenças nas características espectrais das plantas afetadas por estresses bióticos e abióticos. A presença de doenças ou danos de insetos nas plantas causa mudanças no pigmento, concentrações, estrutura celular, nutrientes, captação de água e troca gasosa, as quais resultam em diferenças de cor e temperatura do dossel (parte superior das plantas) e afetam a refletância, características que podem ser detectadas por sensoriamento remoto.
O processo de mecanização e informatização para gestão das lavouras, aliado ao fortalecimento do agronegócio, têm impulsionado a consolidação de um segmento internacionalmente notável pela produtividade, eficiência e competitividade.
Sistemas Ciber-Físicos, do inglês Cyber-Physical Systems (CPS), é a denominação que passou recentemente a ser empregada para identificar uma grande gama de sistemas complexos, que envolvem conhecimentos multidisciplinares, e que integram sistemas computacionais embarcados interagindo com o mundo físico (GUNES et al., 2014). Este tipo de sistema agrega tecnologias modernas que envolvem redes de sensores sem fio, big data, internet das coisas (do inglês Internet of Things - IoT), VANT, etc. Os sistemas sistemas ciber-físicos têm aplicabilidade em diversas áreas da sociedade atual, destacando-se as áreas de saúde, cidades inteligentes e a agricultura, a partir do emprego de MIP.
Este projeto atua em dois problemas relacionados ao manejo integrado de pragas: o desenvolvimento de um sistema de redes de sensores sem fio para o monitoramento on-line de dados meteorológicos e de caracterização de solo, que permitam a integração com outros dispositivos que empresa Partamon produz; e o estudo e proposição de técnicas de visão computacional para realizar a contagem de plantas, identificar linhas de plantio e determinar a sanidade do cultivo.
1) Redes de Sensores Sem Fio
A implementação de MIP depende do monitoramento da população de pragas, associado a observação de variáveis climáticas. Sabe-se que as condições climáticas podem afetar a dinâmica de proliferação de pragas. A partir da compreensão da dinâmica de crescimento populacional, pode-se atuar com precisão, no momento e local adequado, no combate as infestações daninhas (SHELTON; BADENES-PEREZ, 2006; JIANG et al., 2008).
Uma técnica comum para o monitoramento de pragas é o uso de armadilhas, que são capazes de capturar insetos utilizando algum tipo de isca. Ao adentrar a armadilha, os insetos não podem mais deixa-la. Desta forma, é possível recolher os dados da contagem de indivíduos periodicamente.
Usualmente, os métodos utilizados para realizar a contagem de indivíduos ainda são mais rudimentares, necessitando de intervenção humana. Neste caso, um operador precisa visitar as armadilhas e realizar a contagem de forma manual. Pode-se imaginar que esta abordagem apresenta alguns inconvenientes, pois gera trabalho intensivo, insalubre e oneroso, além de limitar a frequência em que os dados são coletados. Tipicamente, a coleta ocorrem um espaçamento semanal ou maior, o que impede um acompanhamento preciso da dinâmica populacional.
As redes de sensores sem fio vem sendo utilizadas em diferentes áreas e possuem grande aplicabilidade na Agricultura de Precisão (BOGENA et al., 2010; BURRELL; BROOKE; BECKWITH, 2004; KASSIN; HARUN, 2016; LEE et al., 2010; LI; CUI; LI, 2011; REHMAN et al., 2011; ROCCIA, 2011; RUIZ-ALTISENT et al., 2010). Usualmente, estas redes são compostas por nós sensores que coletam dados e os transmitem para um nó sorvedouro, que por sua vez envia os dados para um sistema central (CARVALHO et al., 2012). Segundo KARL; WILLIG, 2005, um nó sensor possui cinco componentes básicos: (1) microcontrolador, (2) memória, (3) sensores e atuadores, (4) protocolo de comunicação e (5) fonte de energia. Atualmente existe uma grande quantidade de componentes disponíveis no mercado para a construção de nós sensores. Entretanto, ainda existem desafios para se estabelecer uma rede de sensores sem fio. Pode-se dizer que os principais estão no emprego de mecanismos tolerante a falhas, escalabilidade, custo, ambiente de monitoramento, meio de transmissão e consumo energético (AKYILDIZ et al, 2002; SOUSA; LOPES, 2011).
A Partamon, em parceria com o Grupo de Pesquisa em Engenharia de Sistemas Ciber-Físicos, já desenvolve dois protótipos de nós sensores: uma armadilha eletrônica e uma estação meteorológica. Porém, estes dispositivos ainda apresentam desafios, principalmente, no que diz respeito ao sistema de transmissão de dados, consumo energético e custo. Neste projeto propõe-se o desenvolvimento de subsistemas de comunicação e de potência que serão integrados aos nós sensores, viabilizando a construção de RSSF para o MIP. Outro inconveniente é que a estação meteorológica concentra todos os sensores que medem variáveis climáticas. Para alguma culturas, é interessante ter nós sensores, com subconjuntos de sensores, espalhados pela área monitorada, a fim de monitorar microclimas nas zonas de plantio. Desta forma, ainda no escopo do projeto, pretende-se oportunizar o desenvolvimento de nós sensores a partir de uma plataforma versátil para acoplar sensores e atuadores, implementando um conceito de computação pervasiva, tendo como meta garantir: a escalabilidade, permitindo que grandes áreas sejam cobertas; o baixo custo, dado esta necessidade de escalabilidade e sua viabilidade de aplicação no mercado; e o baixo consumo de energia, com o objetivo de permitir que suas baterias sejam substituídas apenas quando a manutenção obrigatória dos dispositivos for ser realizada.
2) Visão Computacional aplicada ao MIP
A visão computacional tem uma vasta gama de aplicações na sociedade atual (SZELISKI, 2010). Na agricultura, a visão computacional possibilita a automação de pelo menos cinco aplicações distintas (PHASE1 TECHNOLOGY CORPORATION, 2018):
- Robótica no campo: para automatização do processo de plantio, colheita, combate a plantas predatórias, entre outros;
- Identificação de fenótipo: para identificar plantas que se desenvolvem bem após o plantio;
- Classificação para distribuição: plantas mais resistentes podem ser selecionadas para distribuição em regiões mais distantes enquanto plantas que não apresentam tanto vigor são selecionadas para distribuição em mercados locais;
- Identificação de estoque: automatização do processo de contagem de plantas;
- Veículos autônomos.
A identificação de fenótipo e de estoque relacionam-se com o MIP, pois a através de características da planta, pode-se determinar sua sanidade, bem como acompanhar o crescimento das plantas na zona de plantio (PATRÍCIO; RIEDER, 2018).
O sensoriamento remoto pode ser utilizado para monitorar zonas de plantio (PONZONI; SHIMABUKURO; KUPLICH, 2007). Uma das técnicas mais comuns para realizar este tipo de análise é medir o espectro eletromagnético refletido em alvos na superfície terrestre (ABREU; COUTINHO, 2014). O uso de VANT para aquisição sistematizada de imagens tem se tornado popular, sendo que eles podem carregar diferentes tipos de sensores para a aquisição de imagens, incluído sensores multiespectrais. Já existem trabalhos que aplicam visão computacional para extração de informação de datasets de imagens obtidas por VANTs (SILVA, 2017; BAUER et al., 2019) associados o uso de técnicas de aprendizado de máquina (MANIYATH et al., 2018; MOHANTY; HUGHES; SALATHÉ, 2016; OWOMUGISHA et al., 2018). Embora existam diversos trabalhos que explorem este tipo de aplicação, ainda existem alguns desafios para disponibilizar este tipo de tecnologia para o setor produtivo.
No escopo deste projeto, se estudará técnicas de visão computacional que serão integradas à plataforma Vantum, de forma que seja possível realizar a contagem de plantas, identificar linhas de plantio e determinar a sanidade das plantas para duas culturas de interesse das empresas parceiras: cana-de-açúcar e soja.