Em bovinos de corte, o interesse por melhorias genéticas vem crescendo nas últimas décadas, fazendo com que vários criadores estejam investindo em avaliações genéticas, buscando a redução dos custos de produção e melhorias na rentabilidade dos rebanhos. Entretanto, para a condução eficiente de programas de melhoramento são fundamentais estudos visando determinar os valores dos parâmetros genéticos para as características de interesse, os quais são escassos em animais da raça Angus criados no Brasil (Cardoso et al., 2004; Weber et al., 2009; Everling et al., 2012).
Uma característica importante e atualmente estudada na raça Angus é o pelame, principalmente devido à busca crescente por animais mais adaptados ao clima tropical, para serem utilizados em cruzamentos com zebuínos. O comprimento e a espessura dos pelos estão relacionados com a capacidade de adaptação do animal ao meio ambiente, pois a evaporação é o principal mecanismo de perda de calor em bovinos (Nardone et al., 2006; Gray et al., 2011). Além disso, os animais podem apresentar redução no desempenho produtivo em situações climáticas desfavoráveis em função do tipo de pelame (Bertipaglia et al., 2007; Takahashi, 2012).
Animais jovens da raça Angus expostos ao estresse pelo calor apresentam menor taxa de crescimento e, consequentemente, maior período para atingir o peso de comercialização, com incrementos significativos nos custos de produção (Psaros, 2013). É importante destacar que bovinos com pelos curtos e lisos apresentam maior adaptação ao meio ambiente (Bertipaglia et al., 2007; Gray et al., 2011) e menor infestação de carrapatos (Fraga et al., 2003; Reimann et al., 2016). Dessa forma, a seleção para pelame curto em Bos taurus de aptidão para carne mantidos em regiões tropicais pode ser vantajosa (Olson et al., 2003).
O pelame pode ser avaliado por meio de escores visuais que variam de 1 a 3, sendo 1 atribuído a animais com pelos curtos e lisos, 3 para animais com pelos longos e lanosos e 2 para uma condição intermediária. Dessa forma, animais com valores genéticos menores e negativos são desejáveis (Gensys, 2016). Segundo Barichello et al. (2010), o escore visual para pelame de animais da raça Canchim apresenta alta herdabilidade (0,52), o que indica que a frequência de alelos favoráveis pode ser alterada por meio de seleção. De modo semelhante, Reimann et al. (2016) estimaram herdabilidades de moderada magnitude para o escore visual de pelame na desmama (0,44) e ao sobreano (0,42) e correlação genética de 0,62 entre essas características, em animais das raças Hereford e Braford.
Estudando características relacionadas ao pelame em vacas da raça Braford, Bertipaglia et al. (2007) relataram herdabilidades de 0,16 para a espessura do pelo, 0,18 para o comprimento do pelo, 0,08 para número de pelos, 0,12 para diâmetro do pelo, 0,30 para refletância do pelo e 0,10 para a taxa de transpiração. Além disso, as correlações genéticas entre essas características foram favoráveis à seleção de animais a serem mantidos em ambientes tropicais. Ainda segundo esses autores, as características de pelame e relacionadas à capacidade de evaporação cutânea (sudação) são importantes para a adaptabilidade ao estresse térmico e devem ser mais bem estudadas para posteriormente serem consideradas na seleção. Em um segundo estudo, visando determinar os efeitos das características do pelame e da taxa de sudação sobre o desempenho reprodutivo de vacas da raça Braford, Bertipaglia et al. (2008) demostraram que o pelame não deve causar efeitos importantes sobre o intervalo de partos e dias para o parto, mas a menor capacidade de sudação está associada a um maior número de dias para o parto.
Caraterísticas categóricas, como o escore visual de pelame, podem não apresentar distribuição normal, levando a um viés na estimação de parâmetros genéticos e predição de valores genéticos por meio de modelos lineares que consideram a distribuição normal dos resíduos como premissa para sua aplicação. Dessa forma, vários autores (Ramirez Valverde et al., 2001, Luo et al., 2002, Marcondes et al., 2005, Faria et al., 2009) sugerem a utilização de modelos de limiar para a análise de dados com distribuição discreta, por apresentarem sensibilidade maior para detectar variabilidade genética, comparado aos modelos lineares.
Apesar da importância que o pelame representa na capacidade de adaptação de animais mantidos em regiões de clima tropical, poucos estudos foram realizados visando determinar a variabilidade genética da característica em bovinos de corte (Bertipaglia et al., 2007; Barichello et al., 2010; Riley et al., 2012; Reimann et al., 2016). De modo geral, espera-se que a seleção baseada no pelame proporcione ganhos genéticos para a característica. Entretanto, novos estudos precisam ser realizados visando elucidar as relações genéticas existentes entre o escore de pelame atribuído na desmama e ao sobreano com outras características consideradas na seleção, como as relacionadas ao crescimento, composição corporal e reprodução.
As características de crescimento são geralmente utilizadas como critérios de seleção em bovinos de corte. Pesagens realizadas ao nascimento, desmama, ano e sobreano e ganhos em peso entre essas idades são fáceis de serem obtidas e, em geral, são correlacionadas geneticamente e de maneira positiva entre si (Ribeiro et al., 2001; Dias et al., 2005; Lopes et al., 2011; Lopes et al., 2016; Passafaro et al., 2016). Além disso, as características relacionadas ao crescimento apresentam heritabilidades de moderadas magnitudes, variando de 0,22 a 0,55 em raças taurinas (Vallée et al., 2013; Kause et al., 2015; Schiermiester et al., 2015; Englishby et al., 2017) e de 0,21 a 0,57 em zebuínos (Zuin et al., 2012; Boligon et al., 2013; Lopes et al., 2016; Tineo et al., 2016).
Os escores visuais atribuídos para características morfológicas, como conformação, precocidade de terminação e musculatura, são utilizados para identificar indivíduos de conformação ideal e tentar predizer as medidas que seriam obtidas no momento em que os animais forem abatidos (Queiroz et al., 2013). Em rebanhos criados de maneira extensiva, avaliações por escores apresentam algumas vantagens práticas, como o baixo custo, facilidade de implementação e a possibilidade de mensurar lotes de animais de forma rápida (Cardoso et al., 2004). Para bovinos de corte de raças taurinas, as herdabilidades para esses escores apresentam baixa a moderada magnitude, variando de 0,12 a 0,19 para conformação, 0,14 a 0,25 para precocidade e 0,10 a 0,26 para musculatura (Cardoso et al., 2004; Queiroz et al., 2013; Tineo et al., 2016).
A utilização de características reprodutivas mensuradas em fêmeas em programas de melhoramento de bovinos pode contribuir para o aumento da produtividade. A duração da gestação apresenta associação com o período reprodutivo, peso ao nascer do bezerro e com a facilidade de parto (Rocha et al., 2005). Vacas com gestações curtas parem mais cedo, estando disponíveis na próxima estação de monta (Chud et al., 2014; Jenkins et al., 2016). Em estudos recentes (Chud et al., 2014; Silveira et al., 2015) foram estimadas herdabilidades de 0,10 a 0,38 para a duração da gestação de vacas da raça Nelore. Trabalhando com animais da raça Angus, Jeyaruban et al. (2015) reportaram alta herdabilidade para a duração de gestação (0,59) e de menor magnitude para a facilidade parto (0,24). Nesse mesmo estudo, ao considerar a herdabilidade média obtida em cinco raças taurinas, foram relatados valores de 0,47 e 0,23 para a duração da gestação e facilidade de parto, respectivamente. De modo semelhante, Mujibi et al. (2009) obtiveram alta herdabilidade (0,62) para a duração da gestação de animais da raça Charolês.
Em relação a associações genéticas, Jeyaruban et al. (2015) estimaram correlação genética de 0,28 entre a duração da gestação e o peso ao nascer de animais da raça Angus e Mujibi et al. (2009) reportaram correlação genética de 0,43 e 0,17 entre a duração da gestação com o peso ao nascer e a facilidade de parto, respectivamente. De modo geral, estudos recentes indicaram que a seleção para gestações mais curtas não deve influenciar negativamente a condição corporal, sobrevivência e dificuldade de parto (Chud et al., 2014; Silveira et al., 2015; Jeyaruban et al., 2015; Jenkins et al., 2016). Entretanto, ainda são escassos os trabalhos relacionando a duração da gestação com medidas comumente utilizadas na seleção de animais da raça Angus, como pesos em diferentes idades e perímetro escrotal.
A obtenção das mudanças genéticas que ocorrem ao longo do tempo é fundamental em programas de avaliação genética, pois permite monitorar as alterações ocasionadas pelo processo de seleção. Entretanto, em muitos estudos com bovinos de corte são analisados basicamente registros de produção ou de características incluídas nos índices de seleção, com uma menor preocupação com possíveis alterações genéticas em outras características, como as reprodutivas e relacionadas à adaptabilidade dos animais, em decorrência da seleção direta ou como resposta correlacionada da seleção praticada.
O conhecimento da resposta esperada à seleção para características importantes economicamente em cada população torna possível o desenvolvimento de programas de melhoramento genético com foco específico nos objetivos dos criadores de cada raça e região, considerando suas particularidades. Essas informações são úteis para definir os critérios de seleção mais adequados e prever os possíveis ganhos a serem obtidos em diferentes características com a seleção praticada.