Nome do Projeto
ESTABELECIMENTO DE UMA TERAPIA CONTRA COVID-19 UTILIZANDO SORO HIPERIMUNE EQUINO
Ênfase
Pesquisa
Data inicial - Data final
01/07/2020 - 01/07/2023
Unidade de Origem
Coordenador Atual
Área CNPq
Ciências Biológicas
Resumo
Com milhões de casos confirmados, a pandemia COVID-19 desafia sistemas de saúde em todo o mundo. A maioria das ações de combate à pandemia concentra-se na prevenção de infecções, detecção, monitoramento e cuidados de suporte visto que, nenhum tratamento anti-SARS-CoV-2 específico é recomendado devido à ausência de evidências. Estudos sugerem que a imunização passiva com plasma convalescente ou soro hiperimune produzirá efeito profilático e clínico sobre a infecção, especialmente se o tratamento for iniciado precocemente. Dessa forma, o objetivo dessa proposta é estabelecer uma terapia contra Covid-19 utilizando anticorpos (F(ab’)2) produzidos em equinos. Serão produzidos soros hiperimunes anti-SARs e contra epítopos virais específicos (S, spike protein gene) a partir da imunização de equinos. O soro será purificado e os anticorpos fragmentados a fim da obter a somente a região F(ab’)2). Os anticorpos serão caracterizados através de ELISA indireto, Western blot e soroneutralização. Demonstrado in vitro o potencial dos anticorpos para uso em terapias será verificada a inocuidade em indivíduos saudáveis. A eficácia do tratamento será avaliada pela administração dos anticorpos à pacientes infectados por Covid-19 internados no Hospital Escola (UFPel). Acredita-se que a imunização passiva, com anticorpos anti-SARS, proporcionará uma resposta rápida, essencial em casos graves, reduzirá o período de internação, diminuindo os custos e demandas hospitalares.

Objetivo Geral

Desenvolver um tratamento contra Covid-19 utilizando soro hiperimune de equinos.

Justificativa

A infecção pelo novo Coronavírus (SARS-CoV-2), descoberto no final de 2019, denominada (Covid-19), acomete mais de 1,5 milhões de indivíduos e registra mais de 92 mil óbitos em todo o mundo (WHO, 2020). No Brasil, a estimativa de ocorrência da doença, que era de no mínimo 14 mil casos confirmados e cerca de 800 mortes, já foi ultrapassada mesmo havendo uma subnotificação de casos devido à indisponibilidade de diagnóstico para a maioria da população. No momento as ações, segundo a Organização Mundial da Saúde (WHO), concentram-se principalmente na prevenção de infecções, detecção, monitoramento e cuidados de suporte, visto que nenhum tratamento anti-SARS-CoV-2 específico é recomendado devido à ausência de evidências (CHEN et al., 2020).
Estudos sugerem que a administração de plasma ou soro convalescente, bem como de imunoglobulina específica, produzirá um efeito preventivo e também clínico no tratamento de Covid-19 pois, diferente da imunização ativa, a transferência passiva de anticorpos não requer o desenvolvimento de resposta imune, conferindo imunidade de forma imediata (CASADEVALL & PIROFSKI, 2020). A eficácia da terapia baseada na administração de plasma ou soro convalescente se dá pela capacidade dos anticorpos disponibilizados de neutralizar o vírus e suprimir a viremia, acelerando a recuperação dos tecidos infectados e prevenindo possíveis reinfecções (LU et al., 2016). Pesquisas relacionadas a infecções respiratórias graves por coronavírus (SARS) e influenza revelaram evidências consistentes de redução da mortalidade e do período de internação, especialmente quando o plasma convalescente foi administrado logo após o início dos sintomas, período em que a carga viral é menor em relação à doença já estabelecida (SOO et al., 2004; CHENG et al., 2005, LAI, 2005; MAIR-JENKINS et., 2015).
No entanto, problemas de segurança com relação à administração de plasma, como a transmissão de doenças, reações alérgicas e eficácia variável, tornam seu uso uma abordagem controversa (ERHABOR et al., 2011). Ainda, limitações a cerca da disponibilidade, acompanhamento e análise do histórico clínico de pacientes, coleta suficiente de plasma ou soro anti-SARS-CoV-2 para atender a demanda atual e criação de um banco de plasma devem ser considerados.
O uso de anticorpos policlonais, obtidos a partir de soro hiperimune produzido através da imunização de animais, pode superar as limitações do uso de soro convalescente, visto que os anticorpos podem ser caracterizados e produzidos em larga escala. Devido à facilidade de gerenciamento e alto rendimento de anticorpos, o modelo equino é o mais usado na produção de soros (ZHENG et al., 2016). Os efeitos colaterais desta terapia, como reações anafilactóides, são evitadas ou reduzidas com a purificação dos anticorpos e remoção da porção Fc das imunoglobulinas, tornando a terapia aplicável a humanos (BLEEKER et al., 2000; GUIDOLIN et al., 2016; RATANABANANGKOON et al., 2016; WANG et al., 2018). No cenário de infecções virais, anticorpos produzidos em equinos são usados na terapia de infecções víricas como: Ebola (JAHRLING et al., 1996), Raiva (LANG et al., 1998; SATPATHY et al., 2005), Hepatite B (CHIBA et al., 20003; DAHMEN et al., 2004) e HIV (WATT et al., 2001; FERRANTELLI et al, 2002).
A proteína S (spike protein) presente no envelope viral do SARS-CoV-2, bem como de outros coronavírus, é responsável por mediar o processo de entrada na célula hospedeira. Ela é clivada pelas proteases do hospedeiro nas subunidades S1 e S2, as quais são responsáveis pelo reconhecimento do receptor e fusão na membrana celular, respectivamente (WANG et al., 2020). Trata-se de um dos principais determinantes da virulência do vírus, do tropismo tecidual e da variedade de hospedeiros. Vírus RNA, como o SARS-CoV-2, apresentam frequentes mutações, contudo, são poucas as diferenças encontradas na proteína S das variantes emergentes de SARS-CoV-2. Até o início de março de 2020, as sequencias de resíduos de aminoácidos da proteína S de isolados no Brasil, Estados Unidos, Índia e China permaneceram idênticas, o que a torna o principal alvo da neutralização de anticorpos e desenvolvimento de vacinas atualmente (ROBSON, 2020). Pesquisadores desenvolveram anticorpos monoclonais que se ligam a proteína S, impedindo a infecção de novas células in vitro (TIAN et al., 2020). Acredita-se que uma terapia baseada em um coquetel de anticorpos pode atuar na prevenção e tratamento de COVID-19.
Neste contexto, nosso estudo propõe estabelecer uma terapia baseada na administração de anticorpos (F(ab’)2) anti-SARS-CoV-2 e contra epítopos da proteína S produzidos a partir da imunização de equinos, visando disponibilizar uma terapia capaz de atuar na profilaxia da doença, bem como no tratamento de indivíduos acometidos pelo SARS-CoV-2.

Metodologia

Aspectos éticos. Os experimentos realizados em equinos serão realizados de acordo com as recomendações do Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal – CONCEA e do Comitê de Ética em Experimentação Animal – CEEA/UFPel. Os ensaios clínicos serão realizados de acordo com as recomendações da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP).

Antígenos. O vírus SARS-CoV-2 será fornecido pelo Dr. Fernando Spilki (Feevale). Os antígenos recombinantes (epítopos da proteína S) serão selecionados e desenhados através de vacinologia reversa, o plasmídeo contendo o gene de interesse será clonado em diferentes vetores, visando determinar o melhor sistema de expressão para a manutenção das características da proteína nativa, como os sítios de glicosilação e a conformação estrutural, a fim de manter o potencial antigênico da proteína. A equipe do laboratório de Microbiologia (Biotecnologia-UFPel), coordenado pelo Dr. Fábio Leite, realizará a clonagem no vetor de expressão Pichia pastoris (DUMMER et al., 2009; AHMAD et al., 2014; BAGHBAN et al., 2018), enquanto que a expressão em E. coli (RAMOS et al., 2004; JIA & JEON, 2016; GILEADI, 2017) será realizada nos laboratórios de Imunologia Aplicada e Pesquisa em Doenças Infecciosas sob coordenação do Dr. Fabrício Conceição e Dr. Alan McBride (UFPel). Ainda, no laboratório de Virologia e Imunologia da Faculdade da Veterinária/UFPel, coordenado pelos Dr. Geferson Fischer e Dr. Marcelo Lima será realizada a expressão em Baculovírus (CHAMBERS et al., 2018, IRONS et al., 2018; KOST & KEMP, 2016).
Produção do soro hiperimune. A produção do soro hiperimune será realizada pela imunização de equinos saudáveis disponibilizados pelo Centro de Ensino e Experimentação em Equinocultura da Palma (CEEEP) e em colaboração com Hospital de Clínicas Veterinárias, ambos da UFPel. Os equinos serão selecionados por peso e volume sanguíneo, hematócrito e proteína plasmática total. Para a produção de soro anti-SARS-CoV-2 os animais serão imunizados via subcutânea com doses de 2 mL contendo 108 UFP do vírus SARS-CoV-2 inativado e adicionado a uma emulsão oleosa múltipla como adjuvante. Além do soro contra a partícula viral total também será produzido soro contra epítopos recombinantes da proteína S. A produção será feita através da imunização dos animais com 0,8 mg da proteína recombinante adsorvida em emulsão oleosa. As imunizações serão realizadas nas semanas 0, 2, 4 e 6 e amostras de sangue serão coletadas, por punção da veia jugular, nas semanas 1, 3, 5 e 7 para a obtenção do soro e monitoramento da soroconversão através de ELISA indireto. Poderão ser realizadas doses extras de imunização de acordo com a produção de anticorpos. Inicialmente, cada antígeno será administrado em 5 equinos, visando o rendimento de 6 a 12 mg de anticorpo/L de sangue. Ao final do processo de imunização será coletado sangue (~2% do peso vivo) em bolsas estéreis (sistema fechado) aproximadamente 5 litros de plasma por sangria em ciclo de 1 hora total. Os equinos serão avaliados por exame clínico e por meio de hematologia diariamente para avalição da resposta inflamatória ou infecciosa.

Purificação das IgG e obtenção da porção F(ab)2. O sangue dos animais imunizados será centrifugado para a obtenção do soro hiperimune. Para a purificação de IgG total, o soro será diluído em solução salina fosfatada (PBS) na proporção de 1:8, e centrifugado à 16.000 g rpm por 30 min. O sobrenadante será submetido a filtração através de filtro de 0,45 µm, e então purificado por cromatografia de afinidade em colunas conjugadas à proteína A. A obtenção do porção F(ab’)2 será realizada utilizando a enzima pepsina para remover a porção Fc das imunoglobulinas. Para isso, as IgG totais serão diluídas com tampão acetato de sódio (0,2 M, pH 3,0) para 1,0 mg / ml, e a pepsina será então adicionada em uma proporção de massa de 1:50. A reação de digestão será realizada a 37 °C por 36 h e então finalizada pela adição de tampão Tris-base (2 M, pH 9,0) para ajustar o pH para 7,0. Os produtos de digestão serão purificados em coluna de proteína A e o fluido eluído será submetido à filtração tangencial para remover a pepsina e pequenas proteínas moleculares. As frações F(ab)2 serão quantificadas pelo método BCA e submetidas a SDS-PAGE para verificar vestígios não digeridos.

Caracterização do soro hiperimune. Os anticorpos (F(ab)2) serão caracterizados e titulados através de ELISA indireto utilizando como antígeno o vírus SARS-CoV-2 inativado (106–108/cavidade) e os epítopos virais recombinantes (50–200 ng/cavidade). Os antígenos serão diluídos em tampão carbonato-bicarbonato (pH 9.0) e adicionados às microplacas. Os anticorpos serão diluídos (1:100–1:12000) em solução salina fosfatada (PBS) e adicionados em triplicada às cavidades. Será utilizado o anticorpo anti-equino conjugado com peroxidase e posteriormente, o substrato contendo OPD (O-fenilodiamina) e peróxidos de hidrogênio. A caracterização também será realizada através de Western blot a fim de determinar o epítopo viral imunodominante reconhecido pelos anticorpos. Para a execução da técnica, os antígenos serão submetidos a SDS-PAGE e em seguida, eletrotransferidos para membrana de nitrocelulose. Os anticorpos serão adicionados à membrana após o bloqueio da mesma a fim de evitar reações inespecíficas. Será novamente utilizado o anticorpo anti-equino conjugado com peroxidase e posteriormente, o substrato à base de DAB (3'3 Diaminobenzidine).

Soroneutralização. O título de anticorpos (F(ab’)2) neutralizantes será determinado através do teste de neutralização do efeito micro-citopático (CPE) com SARS-CoV-2. Os fragmentos F(ab')2 anti-SARS-CoV-2 e epítopos recombinante (S) serão diluídos de 1:10 a 1:5120. As soluções de anticorpos (100 μl) serão misturadas em 1:1 (v/v) com suspensão contendo 108 UFP do vírus SARS-CoV-2 e incubadas a 37 ° C por 1 h. A mistura vírus-anticorpo será transferida para placas de 96 cavidades contendo monocamadas de células (ex. Vero, MRC-5 ou MDCK) e incubadas a 37 °C em estufa contendo 5% de CO2. Serão adicionados controles contendo somente o vírus e somente os anticorpos. O efeito micro-citopático será observado a cada 24 h durante por 6 dias. O título de anticorpos neutralizantes será expresso como o valor recíproco da maior diluição de F(ab')2 capaz de neutralizar o vírus.

Avaliação da inocuidade: Para verificar a inocuidade dos anticorpos, caracterizando quaisquer efeitos colaterais, estes serão administrados via intravenosa (15-10 mg/kg) em 20 voluntários saudáveis. Os indivíduos serão monitorados, pelo período de duas semanas, quanto aos sinais fisiológicos como: temperatura corporal, frequência cardíaca e respiratória, náusea, vertigem, cefaleia ou qualquer outro sinal distinto da condição saudável habitual do indivíduo. Serão realizadas coletas de sangue, antes e após a administração dos anticorpos, para análises bioquímicas e caracterização da resposta imune.

Eficácia do tratamento. A efetividade do tratamento será verificada por colaboradores do Hospital Escola (UFPel). Brevemente, os anticorpos serão administrados via intravenosa em 20 pacientes internados diagnosticados com Covid-19. Os protocolos de administração e avaliação do tratamento serão estabelecidos pela equipe médica responsável e submetidos à aprovação dos comitês de ética

Indicadores, Metas e Resultados

Ao final do primeiro trimestre pretende-se obter o soro hiperimune anti-SARS-CoV-2 e contra os epítopos recombinantes.
A partir do soro hiperimune serão obtidos os anticorpos - porção F(ab’)2. Estima-se a obtenção de aproximadamente 24 g de anticorpos F(ab’)2 anti-SARS-CoV-2 e contra os epítopos recombinantes por animal imunizado, no segundo trimestre.
Posteriormente, os anticorpos serão caracterizados através de ELISA indireto, Western blot e soroneutralização. E, em seguida, será realizada a avaliação da inocuidade dos anticorpos em indivíduos saudáveis.
Devido a urgência de uma terapia que possa ser implementada no tratamento de Covid-19, serão realizados esforços para que os anticorpos sejam disponibilizados o mais breve possível. Neste sentido, os protocolos serão padronizados, ainda durante o período de imunização dos equinos, utilizando soros já disponíveis no laboratório. Imediatamente após as análises de soroneutralização e inocuidade, os anticorpos serão fornecidos ao Hospital Escola da UFPel para avaliação da eficácia no tratamento de Covid-19.

Com o desenvolvimento do projeto serão obtidos anticorpos anti-SARS-CoV-2 que poderão ser utilizados na prevenção, tratamento e diagnóstico de Covid-19.
O uso dos anticorpos no tratamento de pacientes infectados por Covid-19 neutralizará o vírus, impedindo ou reduzindo a sua replicação e com isso impedirá a evolução dos sintomas, promovendo a remissão da doença e o restabelecimento da saúde do paciente em um menor período. A estratégia de tratamento com imunização passiva permitirá uma resposta rápida, essencial em casos graves.
O estabelecimento de um protocolo eficaz para o tratamento de Covid-19, baseado em anticorpos anti-SARS-CoV-2, diminuirá o período de interação do paciente, reduzindo os custos e a demanda por atendimento hospitalar.
Os anticorpos também poderão ser utilizados na profilaxia de Covid-19, especialmente para profissionais da saúde que estão propensos ao contato com o vírus. Além disso, anticorpos anti-SARS-CoV-2 poderão ser aplicados no desenvolvimento de testes de diagnóstico rápido da doença, contribuindo para o tratamento precoce e monitoramento da evolução dos casos em estudos epidemiológicos.
A detenção da tecnologia de produção pelo Brasil proporcionará a sua independência neste setor e diminuirá despesas relacionadas à importação.

Equipe do Projeto

NomeCH SemanalData inicialData final
ALAN JOHN ALEXANDER MCBRIDE1
CARLOS EDUARDO WAYNE NOGUEIRA1
FABIO PEREIRA LEIVAS LEITE1
FABRICIO ROCHEDO CONCEICAO1
FRANCISCO DENIS SOUZA SANTOS
GEFERSON FISCHER1
GUSTAVO RETZLAF MAAS
MARCELO DE LIMA1
NEIDA LUCIA CONRAD
RENAN EUGÊNIO ARAUJO PIRAINE
RODRIGO CASQUERO CUNHA
SAMANTA WINCK MADRUGA1
VITÓRIA MÜLLER
VITÓRIA SEQUEIRA GONÇALVES

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