Nome do Projeto
Patrimônios culturais, repositórios digitais e experimentos com acervos multimídias: práticas descoloniais, teoria e ensino das ciências
Ênfase
Pesquisa
Data inicial - Data final
16/05/2021 - 20/12/2025
Unidade de Origem
Coordenador Atual
Área CNPq
Ciências Humanas
Resumo
O projeto se destina à avaliação crítica de apagamentos e distorções de gênero, raça e classe em relatos arqueológicos e práticas disciplinares no Brasil, juntamente com elaboração e disponibilização de materiais de ensino e divulgação científica através de portal de internet (repositório digital, ciberexposições, textos paradidáticos, vídeos etnográficos e educativos). O projeto se orienta por uma intervenção (Spivak 1994, 2008) descolonial (Ballestrin 2013, Lugones 2014, Costa 2014) na área de arqueologia, tomando-a por exemplar do campo da ciência e de sua relevância como uma das mais eficientes instituições que atuam na manutenção e propagação do pensamento moderno colonialista (Sandoval 2004, Espinosa-Miñoso 2014, Haber 2016). A estratégia proposta de extroversão e comunicação têm por eixo definidor as discussões de patrimônio digital; patrimônio problematizado como ação e mediação de relações sociais (Gonçalves, 2003; Dodebei, 2006). Dentre os produtos disponíveis no site (tanto os atuais quanto os aqui planejados) tem destaque o tratamento de temas transversais (ética, racismo, sexismo, desigualdade social, etc.) e o atendimento das Leis 10.639/2003 e 11.645/2008, que tratam da obrigatoriedade do ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena nas escolas.

Objetivo Geral

O objetivo geral da proposta é ampliar os usos sociais do conhecimento científico produzido a partir de bens culturais e potencializar o viés de mediador de relações sociais do patrimônio cultural, avaliando criticamente os apagamentos e distorções de gênero, raça e classe em relatos arqueológicos e práticas disciplinares no Brasil e, em contrapartida, elaborando e disponibilizando através de portal de internet materiais de ensino e divulgação científica alinhados a discussões antirracistas, antissexistas e descoloniais.

Justificativa

A abordagem descolonial que orienta o projeto se vincula à história da colonização da América Latina e Caribe do século XVI ao presente. Os efeitos dessa colonização constituem a 'diferença colonial', o lugar de fala daquelas e daqueles que optam, em suas abordagens, por se desligar das epistemologias eurocêntricas, questionando doutrinas e métodos autorizados, em favor de conhecimentos e paradigmas fronteiriços (Ballestrin, 2013; Watts, 2017; Mignolo, 2012). Diferença colonial também é o lugar de enunciação de quem enfatiza em suas abordagens a colonialidade do poder (a continuidade das relações coloniais de poder) através das categorias de gênero, raça e classe (Lugones, 2014). A noção de intervenção (Spivak 1994, 2010) que sustenta o projeto se realiza através da contestação e modificação da forma como lemos e aprendemos, daí o foco da pesquisa e das ações na elaboração de relatos com correção de apagamentos e distorções de gênero, sexo, raça e classe e na disponibilização e circulação de materiais especialmente produzidos para públicos não especializados, incluindo docentes e discentes de ensino fundamental e médio.
Enquanto são vários os mecanismos de divulgação científica e interlocução com pares do meio acadêmico, viabilizados pelas próprias universidades, por agências de fomento à pesquisa e por veículos específicos e disciplinares de comunicação, ressentimo-nos de mecanismos mais abrangentes de socialização dos vastos acervos arqueológicos mantidos por instituições públicas e privadas, de facilitação do acesso a seu potencial didático e expográfico, assim como de uma interlocução mais efetiva entre as pesquisas científicas das ciências sociais, sobretudo da arqueologia, e as sociedades locais. É na busca de alternativas para suprir essa demanda que patrimônio surge como um eixo importante para o encaminhamento da discussão aqui proposta, permitindo conceber a circulação e compartilhamento de conhecimentos produzidos na academia a partir de problematizações colocadas pela área interdisciplinar de estudos do patrimônio. Há um paradoxo embutido no patrimônio cultural como um projeto que busca resguardar as alteridades ou as diversidades culturais, todavia com uma face universalista, com uma “lógica racionalista fundada em conceitos e categorias ocidentais” (Abreu 2013:4). Essa crítica é compartilhada pelo pensamento descolonial, favorecendo a interlocução com discussões onde a ideia de patrimônio tem sido articulada mais como ação que como comunicação, buscando valorizar outros sujeitos, especialmente aqueles por muito tempo menosprezados pelos estudos históricos (Prats, 1998; Ricouer, 2007). De fato, atualmente as discussões sobre Patrimônio começam a entendê-lo como mediador de relações sociais, se preservando no compartilhamento e não necessariamente na acumulação (Gonçalves, 2003; Dodebei, 2008). A dilatação do campo com a inclusão de novos agentes e novos patrimônios abriu caminho para as discussões de patrimônio digital (Oliveira 2016).
Textos, imagens e sons relativos a bens culturais e produzidos ou convertidos em meio digital foram reconhecidos pela UNESCO em 2003 como patrimônio digital. A importância da grande quantidade de bens culturais convertidos ao suporte digital, transformados em bits e lançados na web, é posteriormente reconhecida na Carta sobre Preservação do Patrimônio Digital, assim como a necessidade de envidar esforços para sua preservação, tendo em vista seu caráter muitas vezes efêmero e passageiro (UNESCO, 2012). O processamento digital de bens culturais e sua transferência para o ciberespaço ultrapassam qualquer fronteira regional de acesso, dando aos acervos digitais uma abrangência apenas limitada pela língua (e nunca completamente, tendo em vista os cada vez mais avançados tradutores automáticos disponibilizados pelos próprios navegadores de internet): “Textos, imagens, sons organizados como em um recorte enciclopédico, podem ser acessados em tempo real por um número cada vez mais amplo de internautas que se apropriam, reformatam e devolvem ao ciberespaço novas informações” (DODEBEI, 2006: 03).
O site AMAA foi concebido para atender a demandas locais de acesso e interação com patrimônios culturais, de modo que seus produtos têm por foco sobretudo discussões e contextos materiais do sul do Rio Grande do Sul. Com o projeto em tela queremos ampliar a estrutura já existente e as discussões expressas pelos novos produtos ora planejados, tornando o AMAA útil e acessível para públicos não acadêmicos de todo o país interessados em patrimônios culturais e arqueologia.

Metodologia

Um ponto saliente da crítica descolonial é a urgência do desligamento das epistemologias eurocêntricas e a importância dos conhecimentos e paradigmas outros, não ocidentais, silenciados e propositalmente deturpados pela colonialidade do saber (Watts, 2013; Mignolo, 2012). A continuidade das relações coloniais de poder - colonialidade do poder (Quijano & Wallerstein, 1992), por sua vez, opera através da intersecção de gênero-raça-classe (COSTA, 2014). Uma ferramenta útil para evidenciar vieses eurocentrados e androcêntricos nas ciências, adotada nessa pesquisa, é a avaliação da produção intelectual de uma dada área, através de análises bibliométricas, de discursos, práticas, ou na combinação de mais de um aspecto (Bellini et al 1994, Passos 2017, Bejarano 2009; Grosfoguel 2016). As discussões do sexismo-racismo epistêmico se baseiam em estudo empírico das práticas de leitura e ensino aprendizado na arqueologia brasileira composto por coleta e sistematização de dados quantitativos relativos à padrões de citação bibliográfica, contrastes entre gênero e nacionalidade das pessoas citadas, exposição das assimetrias em números e sua submissão ao escrutínio crítico (Ribeiro et al 2017, Ribeiro 2017). Esses estudos são de suma importância para diagnosticar e identificar temas e pressupostos que podem ser revisados através de relatos objetivos e inclusivos sobre os passados históricos e arqueológicos.
Atualmente a ideia de patrimônio tem sido articulada mais como ação que como comunicação, buscando valorizar outros sujeitos, especialmente aqueles por muito tempo menosprezados pelos estudos históricos. De fato, atualmente as discussões sobre Patrimônio começam a entendê-lo como mediador de relações sociais, se preservando no compartilhamento e não necessariamente na acumulação (Gonçalves, 2003; Dodebei, 2006). Hoje é ponto pacífico que a digitalização e a informatização dos sistemas de documentação são uma estratégia de preservação e socialização de acervos (Oliveira, 2016). Lev Manovich (1997) identifica a mudança do papel do computador de ferramenta para uma máquina de mídia universal que "interfacea" dados predominantemente culturais: textos, fotografias, filmes, música, ambientes virtuais. De acordo com o autor, não estamos mais interagindo com um computador, mas com a cultura codificada em formato digital. O patrimônio cultural é então interfaceado, tornando-se patrimônio cultural digital (Oliveira, 2016).
O AMAA – Acervo Multimídia de Arqueologia e Antropologia propõe tanto compartilhar informações sobre passados distantes e recentes, quanto facilitar a apropriação, reflexão e reorganização das informações por internautas. Em última instância, o acesso amplo e irrestrito a produções de cunho acadêmico/científico produzidas com a intenção de corrigir as históricas assimetrias no uso e destinação social do conhecimento específico, tem um alcance e abrangência ilimitada e potencial para empoderamento, ao disponibilizar dados e argumentos efetivamente auxiliares na mobilização de grupos socialmente marginalizados e movimentos sociais.

Indicadores, Metas e Resultados

1 – Elaboração de Livro eletrônico (e-book) com textos paradidáticos e divulgação científica com temas de patrimônio, arqueologia e antropologia. Em linguagem acessível e descontraída, destinada a públicos jovens de escolas e universitária.
2 – Elaboração de Planos de aula temáticas com indicações de atividades, com quais turmas usar (ensino fundamental e/ou médio) e como articular junto com elas os recursos do AMAA (que podem ser baixados para uso offline) e outros conteúdos multimídia de acesso fácil e gratuito na internet.
3 – Elaboração de Videos etnográficos e educativos com discussões de patrimônio, mundo material, identidade e representação. Vídeos curtos, com até 10 minutos de duração, que podem ser usados em sala de aula.
4 – Ciberexposição com temática indígena arqueológica e etnográfica. Disponibilização no site em 2020
5 – Apresentações em eventos científicos e periódicos especializados dos resultados das análises sobre racismo-sexismo epistêmico na arqueologia e de reflexões sobre patrimônio digital como veículo de comunicação de práticas e discursos descoloniais.

Equipe do Projeto

NomeCH SemanalData inicialData final
GABRIELLE REIS FERREIRA
ISABELLA ALVES GUIMARÃES
LETICIA GONCALVES BENEDUZE
LOREDANA MARISE RICARDO RIBEIRO9

Recursos Arrecadados

FonteValorAdministrador
CNPqR$ 34.600,00Coordenador

Plano de Aplicação de Despesas

DescriçãoValor
339035 - Serviços de ConsultoriaR$ 1.000,00
339018 - Auxílio Financeiro a EstudantesR$ 9.600,00
339014 - Diária Pessoa CivilR$ 4.000,00
339039 - Outros Serviços de Terceiro - Pessoa JurídicaR$ 20.000,00

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