Nome do Projeto
Clube Fica Ahi: valorização e reconhecimento do associativismo negro pelotense
Ênfase
Extensão
Data inicial - Data final
02/07/2018 - 31/12/2021
Unidade de Origem
Coordenador Atual
Área CNPq
Ciências Humanas
Eixo Temático (Principal - Afim)
Cultura / Direitos Humanos e Justiça
Linha de Extensão
Organizações da sociedade civil e movimentos sociais e populares
Resumo
O projeto tem por finalidade prosseguir com a assessoria ao Clube Cultural Fica Ahi Pra Ir Dizendo, por meio do desenvolvimento de ações que assegurem a salvaguarda do seu acervo documental; do alargamento da sistematização da memória do Clube, através do diálogo registrado e coleta de imagens e outros documentos com seus associados; do auxílio e acompanhamento em relação à elaboração e encaminhamento de projetos para agências de financiamento, que visem criar infraestrutura para o pleno funcionamento de um Centro de Cultura Afro-Brasileira; da realização de atividades culturais e acadêmicas diversas, que visem divulgar para a sociedade em geral a trajetória e significado do Clube para a comunidade negra de Pelotas e região. As ações serão realizadas tendo como diretrizes as recentes legislações e paradigmas, nacionais e internacionais, de reconhecimento das manifestações expressivas das diáspora africanas.

Objetivo Geral

Promover a salvaguarda do acervo físico, bens culturais materiais e memória intangível do Clube Cultural Fica Ahi Pra Ir Dizendo, contribuindo, ainda, para a sua divulgação por meio de atividades culturais, sociais e acadêmicas. Desta forma, busca-se fortalecer o Clube enquanto espaço de convivência de parcela da comunidade negra local, assim como seus vínculos com outras organizações e segmentos sociais, contribuindo para o reconhecimento público desta importante organização negra da cidade de Pelotas.

Justificativa

Este projeto é uma continuidade de um projeto anterior, denominado “Assessoria ao Clube Social Negro Fica Ahí Pra Ir Dizendo no seu processo de transformação em Centro de Cultura Afro-brasileira”, que foi desenvolvido entre os anos de 2010 e 2016. Durante o processo de transição de sistema para inscrever os projetos de extensão (ano de 2017), na modalidade "Projetos Unificados", houve a coincidência da sede do Clube ficar interditada para atividades rotineiras, em razão de ampla reforma física efetuada, especialmente no telhado e forros. A retomada do projeto, no ano de 2018, vem atender à solicitação da própria diretoria do Clube, perante à normalização do acesso (mesmo que ainda parcial) às suas dependências internas. Convém assinalar que esse processo de reforma física do prédio comprometeu parcialmente o trabalho que foi realizado por meio do primeiro projeto de extensão, pois resultou em alagamentos que inutilizaram vários documentos, assim como equipamentos que vinham sendo utilizados para o seu tratamento (digitalização, inventário, constituição de acervo digital, etc.). Mas muito do que foi preservado da ocorrência de tais incidentes, o foi justamente pelo cuidado que a equipe havia tido de acondicionar adequadamente os documentos que já haviam sido inventariados. Nesse sentido, o projeto agora apresentado, além de dar continuidade ao que já estava sendo feito, precisará reencaminhar algumas ações relacionadas à constituição de acervos e memórias.
O inventário de documentos do acervo físico iniciou em 2012, por parte de um bolsista de extensão do curso de Museologia. Esse inventário passou por processos de revisão e acréscimo nos anos posteriores, englobando, atualmente, 1.161 documentos, que incluem: fichas de sócios, livros de atas, correspondências, estatutos, livros de debutantes, etc. Parte dos documentos inventariados encontram-se digitalizados (fichas de sócios, que compõe o maior número de documentos), parte não. A continuidade desta digitalização, que é acompanhada de um adequado acondicionamento dos documentos físicos, é fundamental para a salvaguarda deste acervo, perante a possibilidade de qualquer sinistro que venha a comprometer a sua integridade.
Igualmente as ações direcionadas para a reconstituição participativa de memórias, e mapeamento de manifestações expressivas e portadores de saberes relacionados à cultura negra, vinham sendo realizadas secundariamente nos anos anteriores, e pretende-se retomá-la como prioridade na medida em que os cuidados com o acervo físico se consolidarem e normalizarem. Trata-se de uma tentativa de formar um acervo público de memórias orais, que valorize a presença negra na cidade e região.
Acredita-se que tais ações tem muito a contribuir para a educação das relações étnico-raciais de forma ampla, atendendo tanto os preceitos constitucionais de salvaguarda do patrimônio afro-brasileiro, assim como, servindo de suporte para a aplicação da Lei 10.639, que institui a obrigatoriedade do ensino de história e cultura afro-brasileira em todos os níveis educacionais.
A cidade de Pelotas, como é de franco conhecimento, se constituiu, desde fins do século XVIII, em um dos principais centros escravistas do RS, em razão do desenvolvimento das charqueadas. O impulso econômico provocado por todo o complexo charqueador se expressou, por sua vez, no processo de urbanização, também empreendido sob os auspícios da mão-de-obra escrava.
A abolição da escravidão no município, realizada em 1884 sob a cláusula de prestação de serviços durante cinco anos, por parte dos (ex)cativos, sob o pretexto de indenização de seus (ex)proprietários, gerou o grande dilema de como inserir todo um contingente de africanos (ou descendentes de) na sociedade local e nacional. Em um contexto marcadamente discriminatório, que vedava explicitamente a participação dos ex-escravos e descendentes nos espaços de sociabilidade, educacionais e de tomada de decisões, mesmo após a Constituição de 1891 atribuir aos ex-escravos o estatuto de cidadãos, constituiu-se na cidade de Pelotas, como em vários outros lugares, toda uma rede associativa que visava fazer frente às barreiras colocadas pela sociedade envolvente
A necessidade de espaços de sociabilidade e compartilhamento de identidade, ao mesmo tempo que de gestação de projetos políticos que desafiassem a ordem discriminatório vigente, fez eclodir, nas primeiras décadas do século XX, uma sólida rede associativa, da qual faziam parte o que hoje se denomina por Clubes Sociais (ou Culturais) Negros: Depois da Chuva (1916), Chove Não Molha (1919), Quem Ri de Nós tem Paixão (1921), Está Tudo Certo (1931).
O hoje denominado Clube Cultural Fica Ahi Pra ir Dizendo foi criado em 1921 como um Cordão Carnavalesco, assumindo o estatuto de “clube” no ano de 1953. Compartilha com o Clube Chove Não Molha o privilégio de permanecer ativo até os dias atuais. Atualmente integra a rede de Clubes Sociais Negros do Estado do RS, os quais perfazem aproximadamente 50 entidades.
Este breve resgate histórico aponta claramente que a preocupação com a formação política e cultural e com a inserção social igualitária, especialmente dos segmentos afro-descendentes, sempre marcou a atuação do Clube. Este projeto tem por objetivo fomentar a continuidade desta “tradição” do Clube, tendo em vista que, passados mais de cem anos da abolição, a desigualdade racial permanece um problema cadente da sociedade regional e brasileira (Guimarães, 2002; Henriques, 2001). Ao se empenhar, em conjunto com os representantes do Clube, para operacionalizar os objetivos anteriormente expostos, os docentes e discentes da Universidade Federal de Pelotas empenhados neste Projeto de Extensão estarão contribuindo para a criação de mecanismo de superação destas desigualdades no plano local.
As lutas dos segmentos negros organizados nos últimos anos não contemplam, entretanto, apenas a busca da igualdade. O reconhecimento da positividade das suas manifestações expressivas e associativas, enquanto elementos singulares importantes da formação da nação brasileira, encontra-se assegurado nos artigos 215 e 216 da Constituição Federal. Uma série de iniciativas vêm sendo tomadas, nos últimos anos, visando a superação da invisibilidade a que foram submetidas estas formas associativas e expressivas, como é o caso da Lei 10.639/2003, que institui a obrigatoriedade de serem contemplados nas grades curriculares de vários níveis de ensino conteúdos relativos à cultura e história africana e afro-brasileira.

Metodologia

A orientação metodológica geral inscreve-se no âmbito de uma "antropologia da ação" (CARDOSO DE OLIVEIRA, 1996, 2004), que consiste em agir, simultaneamente ao ato de conhecer, assumindo, o profissional da antropologia, compromisso com a busca do bem-viver por parte de comunidades que tradicionalmente foram tomadas tão somente como objetos de estudo. Segundo Cardoso de Oliveira, uma antropologia da ação comprometida com a vida social precisa ser levada a termo por meio de uma ética dialógica, praticada no âmbito de comunidades de comunicação ou argumentação específicas, buscando-se assegurar condições de diálogo o mais simétricas possíveis entre os diversos atores envolvidos.
Esta direção metodológica, por sua vez, vai ao encontro da definição da extensão, por parte de Paulo Freire (1983), como uma relação intersubjetiva, por meio da qual se estabelecem consensos provisórios, entre profissionais e comunidade, sobre o objeto da ação, construindo-se quadros significativos comuns que levam a consensos provisórios sobre problemas e eventuais soluções, sempre passíveis de serem revisados por meio de um "diálogo problematizador".
Nesse sentido, o diálogo com os representantes formalmente constituídos do Clube, assim como demais sócios que queiram se envolver nas atividades, será de fundamental importância para o estabelecimento de prioridades em termos das atividades que serão desenvolvidas. Quem entrevistar? Quais documentos serão primeiro objeto de cuidados? Quais as soluções plausíveis em termos da logística para viabilizar o projeto ou revitalizar o espaço físico? Quais atividades públicas desenvolver e por quais meios? Dentre outras tantas inúmeras questões que irão surgir no cotidiano do projeto, devem ser dialogadas com os integrantes do Clube. Essa ética dialógica é transversal ao projeto, mas necessária especialmente no desenvolvimento da ação 3289 - "Assessoria na elaboração de projetos e atividades culturais".

Em relação à ação 3288 - "Reconstituição participativa da memória do Clube Fica Ahi e mapeamento das manifestações expressivas negras na região".
Dar-se-á continuidade à ações que já estavam em curso. Até então, fazia-se uso de entrevistas qualitativas abertas, por meio do uso do gravador, posteriormente degravadas. Sendo os(as) entrevistados(as) indicados(as) pela própria comunidade ficahiana ou da comunidade negra local/regional. A metodologia de entrevistas qualitativas abertas é passível de ser aplicada também a uma atividade de extensão em razão de que:
“Toda pesquisa com entrevistas é um processo social, uma interação ou um empreendimento cooperativo, em que as palavras são o meio principal de troca. Não é apenas um processo de informação de mão única passando de um (o entrevistado) para outro (o entrevistador). Ao contrário, ela é uma interação, uma troca de idéias e de significados, em que várias realidades e percepções são exploradas e desenvolvidas. [...] Deste modo, a entrevista é uma tarefa comum, uma partilha e uma negociação de realidades” (GASKELL, 2002, p. 73-74).
De todo o modo, o caráter de extensão dessa prática, neste projeto, está relacionada à sua finalidade: constituir um acervo público, direcionado à comunidade em geral, especialmente à comunidade negra, não apenas à um grupo de pesquisadores. Inscreve-se, nesse sentido, no objetivo de reconstituição da memória da presença negra na cidade e região, por seus próprios integrantes e para eles.
Ao todo já foram realizadas 15 entrevistas, que precisam ser retomadas, revisadas e disponibilizadas para o público, com o devido consentimento informado do(a) entrevistado(a). Essa atividade foi levada a efeito de forma secundária nos anos de 2015/2016 por se considerar que o acervo de documentos físicos corria riscos de deterioração, necessitando de mais atenção por parte da equipe do primeiro projeto. Pretende-se agora retomá-la, inclusive junto com o objetivo original: por meio das entrevistas, proceder à uma catalogação das manifestações expressivas negras e portadores de saberes na cidade e região, de acordo com distintos eixos temáticos: Clubes sociais negros; Locais de referência da religiosidade afro-brasileira; Instituições carnavalescas; Portadores de saberes e ofícios artísticos (artesanato, arte visual, músicos, etc.); Entidades/atores de representação política; Grupos e manifestações culturais (dança, capoeira, hip hop, etc.); Lugares de memória da presença afro.
Outra inovação metodológica que pretende-se implementar, relacionada a esta ação, é a promoção de rodas de conversa com associados/as, de forma a: compartilhar as memórias já registradas; fomentar outras memórias; discutir conjuntamente os rumos das ações em curso.

Ação 3287 - "Promoção da salvaguarda do acervo de documentos e objetos físicos do Clube Fica Ahi"
Será primordial, no desenvolvimento desta ação, a atuação da museóloga do Clube, Patrícia Fernandes Mathias Morales, ex-bolsista do projeto anterior, atualmente mestranda em antropologia (PPGANT/UFPEL), com projeto de pesquisa direcionado para o Clube. Além do requisito da formação em museologia, Patrícia é sócio do Clube, o que desconstrói as fronteiras entre profissional e público alvo.
Os procedimentos metodológicos relacionados à esta ação tem sido: higienização do documento, digitalização, inventário em programa de Excell, acondicionamento em envelopes feitos à mão com a devida identificação à lápis, guarda em pasta suspensa em arquivo de aço. Procede-se, ainda, ao tratamento da imagem digital, com nominação padronizada dos arquivos, a depender do tipo de documento, e armazenamento em pastas específicas para cada tipo de documento - fichas de sócios, atas, correspondências, estatutos, etc.
Pretende-se, futuramente, a depender da disponibilização de infraestrutura, disponibilizar o acervo digital para consulta, de forma a não se deteriorar o acervo físico por meio do manuseio.

Indicadores, Metas e Resultados

- Revisão do inventário de documentos físicos até o final de 2018
- Digitalização de todos os livros de atas até o final de 2018 (já se encontram parcialmente digitalizados)
- Digitalização dos demais documentos já disponíveis na sede do Clube (correspondências, livros de debutantes, estatutos, etc.) até o final de 2019
- Acondicionamento adequado de todos os documentos físicos até o final de 2019.
- 2020: Pesquisa junto a sócios e ex-sócios sobre a disponibilidade de documentos e fotografias para digitalização, prevendo-se o empréstimo ou doação ao acervo físico.
- 2021: Pesquisa junto a sócios e ex-sócios sobre a disponibilidade de documentos e fotografias para digitalização, prevendo-se o empréstimo ou doação ao acervo físico.
- Constituição de um acervo digital de acesso público local até o final de 2019 (dependente da disponibilização de infraestrutura por parte do Clube).
- Revisão de 5 entrevistas que já foram realizadas até o final de 2018.
- Revisão de 10 entrevistas já realizadas até o final de 2019, incorporadas ao acervo.
- Constituição de um acervo de memória oral até o final de 2018, com no mínimo cinco entrevistas.
- Realização e tratamento adequado de no mínimo cinco novas entrevistas em 2019, com incorporação ao acervo de memória oral.
- Realização e tratamento adequado de no mínimo cinco novas entrevistas em 2020, com incorporação ao acervo de memória oral.
- Realização e tratamento adequado de no mínimo cinco novas entrevistas em 2021, com incorporação ao acervo de memória oral.
- Promover pelo menos uma roda de conversa com antigos associados em 2018.
- Promover no mínimo 2 rodas de conversa com antigos associados ao ano (2019, 2020 e 2021).
- Promover no mínimo 1 evento anual sobre cultura negra, nas dependências do Clube, de forma a divulgar as atividades do projeto.
- Promover, a partir de 2019, visitas guiadas com estudantes do ensino médio e fundamental, em parceria com Secretaria Municipal de educação e Coordenadoria Regional de Educação, assim como diretorias de escolas públicas ou particulares.

Equipe do Projeto

NomeCH SemanalData inicialData final
BIANCA MENDES DE AVILA
MILENA MENDIONDO DA ROSA
Maitê Santos de Lima
PATRÍCIA FERNANDES MATHIAS MORALES
PAULO RICARDO PEZAT4
ROSANE APARECIDA RUBERT9
Taís Dias Domingues
ÁLISSON BARCELLOS BALHEGO
ÂNGELA BARCELOS FURTADO

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