Nome do Projeto
Diálogos interculturais e mediações políticas: contribuições para o bem-viver
Ênfase
Extensão
Data inicial - Data final
24/10/2022 - 31/12/2025
Unidade de Origem
Coordenador Atual
Área CNPq
Ciências Humanas
Eixo Temático (Principal - Afim)
Cultura / Direitos Humanos e Justiça
Linha de Extensão
Grupos sociais vulneráveis
Resumo
O projeto propõe realizar ou mediar ações ou projetos de cunho socioeconômico, cultural ou educacional, que potencializem a expressão de perspectivas de mundo singulares e/ou expectativas de bem-viver articuladas à construção da equidade social, sustentabilidade ambiental e valorização de legados de práticas e saberes que são produtos de trajetórias coletivas ou individuais singulares. Pautada na ideia de interculturalidade, a proposta alinha-se, portanto, ao intento de construção de projetos de sociedade que comportem a coexistência não hierarquizada de múltiplas perspectivas de conhecimento, sensibilidades e expressão política, estética e ética. Nesse sentido, almeja-se o fortalecimento de dinâmicas locais de associativismos e resoluções de problemas e demandas, de forma a reforçar o protagonismo dos próprios coletivos envolvidos no projeto.
Objetivo Geral
Pretende-se, por meio de múltiplas linhas de ações, potencializar o diálogo entre as áreas de Ciências Sociais (Antropologia, Sociologia e Ciência Política) e grupos específicos, organizações da sociedade civil, associações comunitárias (mesmo que não formalizadas), assim como instituições públicas ou privadas que atuem no desenvolvimento de projetos sociais, culturais e educacionais com vistas à geração de renda a partir de saberes, habilidades e iniciativas próprias aos grupos; fortalecimento da organização política e representatividade perante outras instâncias; valorização de memórias e saberes e potencialização para diálogos interculturais e projetos de educação antirracistas.
Justificativa
A presente proposta de extensão se coloca diretamente como uma continuidade de dois outros projetos coordenados pela mesma pesquisadora, no que tange aos seus objetivos, coletivos envolvidos e ações práticas que procura abranger: “Etnodesenvolvimento e direitos culturais em comunidades quilombolas e indígenas” e “Clube Fica Ahi: valorização e reconhecimento do associativismo negro pelotense”. Além de buscar integrar em uma única proposta ações de extensão que eram desenvolvidas em projetos separados, o projeto procura ampliar o horizonte de atuação, mantendo-se aberto à demandas de outros coletivos não contemplados nos dois primeiros.
Nesse sentido, esse projeto possui um caráter aberto no que se refere ao público ao qual se destina, no sentido de não se restringir a um grupo específico previamente determinado, justamente por almejar se colocar como um espaço de acolhimento de demandas e problemáticas de coletivos como: associações de bairros; associações e comunidades quilombolas; grupos populares de empreendedorismo e economia criativa; organizações e entidades que trabalhem com a autoafirmação identitária e/ou cultura popular; iniciativas de organizações e entidades direcionadas à inserção social; etc. Do mesmo modo, avança-se a abertura para atuações conjuntas com organizações da sociedade civil ou instituições governamentais na abordagem de temáticas que tenham como foco a interseção entre diversidade sociocultural e desigualdade social.
Ao se colocar como um projeto que se constrói na interpelação aberta por iniciativas e problemáticas fora da academia, adota-se, antropologicamente, a perspectiva de que o conhecimento se constrói “[...] a partir de compromissos diretos, práticos e observacionais com as pessoas e coisas ao nosso redor. [...]” (INGOLD, 2020, p. 11). Desde os primórdios, a Antropologia se constituiu em um campo do conhecimento que tem por objetivo compreender, por meio da inserção etnográfica em grupos sociais específicos, como se procede à articulação entre diversidade e semelhanças. A potencialidade de contribuir para práticas mais adequadas de trocas e negociações entre os diferentes grupos, ou entre grupos específicos e poderes constituídos, foi, durante muito tempo, obliterada pelo compromisso da disciplina – como, ademais, outros campos do conhecimento – com um projeto de ciência tributário da modernidade ocidental, que pressupõe uma separação entre sujeito e objeto do conhecimento. Essa separação, por sua vez, reverbera, para o âmbito da produção do conhecimento, relações de poder instituídas por um processo colonial que teve no seu bojo a subalternização de povos não ocidentais, processo que se desdobra, na atualidade, enquanto colonialidade (BERNARDINO-COSTA, 2018; GROSFOGUEL, 2007).
Quando se fala em “colonialidade”, portanto, refere-se à construção de diferenças (ou o seu uso) por meio da articulação do vetor racial e classista, de forma a legitimar e reproduzir desigualdades em uma temporalidade de longa duração, sejam socioeconômicas, seja no acesso à justiça. A esses vetores, à depender do contexto, somam-se outros, como gênero, sexualidade, nacionalidade, origem geográfica, religião, geração, etc. Em estados-nações instituídos sob a égide do processo colonial, como é o caso do Brasil, passou-se a denominar de “colonialismo interno” os efeitos duradouros dessas relações de poder, por meio das quais determinado grupo impõe seus valores e interesses como horizonte hegemônico para o restante da nação (CESARINO, 2017). Esse colonialismo interno se desdobra na desqualificação dos saberes e legados dos grupos que não são eurodescendentes, processo denominado de epistemicídio; na desigualdade socioeconômica, que possui um forte recorte étnico-racial (HASENBALG, 2005; GUIMARÃES, 2002); no não reconhecimento de cidadania plena aos integrantes dos grupos étnico-raciais subalternizados, submetidos a um constante estado de suspeição e violação de direitos, inclusive o direito à vida e à liberdade, especialmente pelos aparatos policiais e judiciais (ALMEIDA, 2019; SERRA et. al., 2016).
A problematização dessas questões, nas últimas décadas, por parte da antropologia, vem desafiando a área a transcender o objetivo convencional de abordar diversidades como realidades acabadas. Ao menos dois importantes desafios se apresentam, então: 1) a compreensão sobre como diferenças são construídas, articuladas à quais intencionalidades ou projetos de sociedade, se para reiterar e justificar desigualdades ou para a afirmação de outras perspectivas de mundo, que insistem em (re)existir mesmo que intensamente assediadas por forças históricas desestabilizadoras. 2) o compromisso prático com projetos de construção do bem-viver dos coletivos tradicionalmente classificados como seu “objeto” de estudo, o que implica no engajamento em processos de expansão do direito e de articulação entre horizontes culturais particulares, e destes com níveis mais abrangentes de pertencimento (SEGATO, 2006).
Como assinala Segato (2006, p. 228), esse compromisso da Antropologia implica em deixar-se interpelar pelas demandas e perspectivas desses grupos historicamente subalternizados, o que se tornou mais premente com a instituição de cotas sociais e raciais no ensino superior, o que possibilitou trazer representantes desses “outros” – integrantes de povos indígenas, afrodescendentes e quilombolas, pessoas oriundas de classes populares, etc. – para dentro dos muros da universidade.
Esses desafios apontados por Segato tornaram-se mais prementes com as políticas de ações afirmativas e processos seletivos especiais para ingresso no ensino superior. Segundo o antropólogo José Jorge de Carvalho, a mudança no perfil dos estudantes universitários só significará um avanço no processo de descolonização acadêmica se for acompanhada pela abertura dessas instituições para os saberes oriundos dos coletivos de onde esses estudantes cotistas provêm. Ou seja, a universidade precisa estar comprometida com uma “[...] formação antirracista, descolonizadora e sensível à diversidade dos saberes não ocidentais criados e reproduzidos pelos negros, indígenas e demais povos tradicionais.” (CARVALHO, 2019, p. 81)
Não abrir as portas da academia para os saberes das comunidades tradicionais e periféricas equivale à uma desqualificação epistêmica desses grupos que hoje possuem integrantes nos bancos universitários, ou seja, equivale à afirmação da superioridade do saber eurocêntrico moderno, situando os estudantes negros, quilombolas, indígenas e de periferias apenas como aprendizes. A refundação da academia, instituída e consolidada a partir de um “paradigma monoepistêmico”, a partir do diálogo com outras formas de saberes e perspectivas de mundo, é fundamental para a constituição de uma universidade pluriepistêmica, pautada no convívio entre princípios diferentes de acesso ao conhecimento, sem que uma forma de conhecer seja necessariamente reduzida aos termos da outra.
[...] Em alguns casos, podemos nos deparar com saberes equivalentes; em outros, serão saberes diferentes, porém complementares; ainda em outros casos, os saberes eurocêntricos e os tradicionais podem mostrar-se incompatíveis. [...] A necessidade de dialogar com os mestres empurrará a universidade para um arranjo transdisciplinar dos saberes, até agora compartimentados, que ela promove através da docência e da pesquisa. [...] (CARVALHO, 2019, p. 97)
Para além dessa possibilidade de encontro de saberes, a atividade extensionista junto a grupos periféricos e tradicionais (ou junto às organizações e instituições que com eles atuem) potencializa um “regime horizontal de troca intelectual e política” (CARVALHO, 2019, p. 103), de forma que determinados segmentos sociais insiram na pauta acadêmica problemas e demandas que efetivamente lhes digam respeito, mesmo quando o almejado é a busca de soluções por meio dos paradigmas vigentes.
Roberto Cardoso de Oliveira (2004) já havia assinalado, alhures, sobre a necessidade do engajamento antropológico na construção do bem-viver dos grupos com os quais se atua, o que estaria inscrito no bojo de uma “antropologia da ação”. O termo “Bem-viver” tem se apresentado, nas últimas décadas, como “un articulador político-discursivo de primer orden” (BLANCO; AGUIAR, 2020, p. 11). No bojo de uma perspectiva de pensamento latino-americana denominada pós-desenvolvimento, e tendo sido forjado a partir de cosmovisões andinas, diz respeito a um conjunto de propostas que buscam articular uma série de movimentos contrahegemônicos, pautados em alguns princípios como: preservação e autonomia sobre os territórios de convivência; consideração da natureza como um sujeito de direitos; valorização dos saberes, memórias, materialidades significativas e manifestações expressivas de coletivos específicos, e os valores, princípios cognitivos e modos de vida que lhes são correlatos; potencialização dos fóruns próprios de tomada de decisões, assim como dos princípios organizacionais e protagonismos intrínsecos a esses coletivos, face às estruturas de poder com as quais interagem; construção de formas dignas de subsistência, pautadas na valorização do trabalho e criatividade, assim como, no comércio justo de produtos produzidos de forma autogestionária; construção de critérios próprios para validar projetos de futuro, sem subjugação à ideologia desenvolvimentista vigente.
Os princípios gerais que alicerçam o paradigma do bem-viver são, por certo, um tanto desafiadores, especialmente em contextos marcados pela desigualdade abismal, tanto econômica como em termos de poder político, como o é o brasileiro. Essa proposta extensionista se coloca, nesse sentido, como um pequeno elo, dentro de uma extensa malha de potenciais articulações entre atores, instituições, organizações e coletivos que promovam projetos de sociedade pautados na equidade e na coexistência da diversidade. É justamente por isso que, ao invés de definir de maneira fechada um público ou organização específica (tal c
Nesse sentido, esse projeto possui um caráter aberto no que se refere ao público ao qual se destina, no sentido de não se restringir a um grupo específico previamente determinado, justamente por almejar se colocar como um espaço de acolhimento de demandas e problemáticas de coletivos como: associações de bairros; associações e comunidades quilombolas; grupos populares de empreendedorismo e economia criativa; organizações e entidades que trabalhem com a autoafirmação identitária e/ou cultura popular; iniciativas de organizações e entidades direcionadas à inserção social; etc. Do mesmo modo, avança-se a abertura para atuações conjuntas com organizações da sociedade civil ou instituições governamentais na abordagem de temáticas que tenham como foco a interseção entre diversidade sociocultural e desigualdade social.
Ao se colocar como um projeto que se constrói na interpelação aberta por iniciativas e problemáticas fora da academia, adota-se, antropologicamente, a perspectiva de que o conhecimento se constrói “[...] a partir de compromissos diretos, práticos e observacionais com as pessoas e coisas ao nosso redor. [...]” (INGOLD, 2020, p. 11). Desde os primórdios, a Antropologia se constituiu em um campo do conhecimento que tem por objetivo compreender, por meio da inserção etnográfica em grupos sociais específicos, como se procede à articulação entre diversidade e semelhanças. A potencialidade de contribuir para práticas mais adequadas de trocas e negociações entre os diferentes grupos, ou entre grupos específicos e poderes constituídos, foi, durante muito tempo, obliterada pelo compromisso da disciplina – como, ademais, outros campos do conhecimento – com um projeto de ciência tributário da modernidade ocidental, que pressupõe uma separação entre sujeito e objeto do conhecimento. Essa separação, por sua vez, reverbera, para o âmbito da produção do conhecimento, relações de poder instituídas por um processo colonial que teve no seu bojo a subalternização de povos não ocidentais, processo que se desdobra, na atualidade, enquanto colonialidade (BERNARDINO-COSTA, 2018; GROSFOGUEL, 2007).
Quando se fala em “colonialidade”, portanto, refere-se à construção de diferenças (ou o seu uso) por meio da articulação do vetor racial e classista, de forma a legitimar e reproduzir desigualdades em uma temporalidade de longa duração, sejam socioeconômicas, seja no acesso à justiça. A esses vetores, à depender do contexto, somam-se outros, como gênero, sexualidade, nacionalidade, origem geográfica, religião, geração, etc. Em estados-nações instituídos sob a égide do processo colonial, como é o caso do Brasil, passou-se a denominar de “colonialismo interno” os efeitos duradouros dessas relações de poder, por meio das quais determinado grupo impõe seus valores e interesses como horizonte hegemônico para o restante da nação (CESARINO, 2017). Esse colonialismo interno se desdobra na desqualificação dos saberes e legados dos grupos que não são eurodescendentes, processo denominado de epistemicídio; na desigualdade socioeconômica, que possui um forte recorte étnico-racial (HASENBALG, 2005; GUIMARÃES, 2002); no não reconhecimento de cidadania plena aos integrantes dos grupos étnico-raciais subalternizados, submetidos a um constante estado de suspeição e violação de direitos, inclusive o direito à vida e à liberdade, especialmente pelos aparatos policiais e judiciais (ALMEIDA, 2019; SERRA et. al., 2016).
A problematização dessas questões, nas últimas décadas, por parte da antropologia, vem desafiando a área a transcender o objetivo convencional de abordar diversidades como realidades acabadas. Ao menos dois importantes desafios se apresentam, então: 1) a compreensão sobre como diferenças são construídas, articuladas à quais intencionalidades ou projetos de sociedade, se para reiterar e justificar desigualdades ou para a afirmação de outras perspectivas de mundo, que insistem em (re)existir mesmo que intensamente assediadas por forças históricas desestabilizadoras. 2) o compromisso prático com projetos de construção do bem-viver dos coletivos tradicionalmente classificados como seu “objeto” de estudo, o que implica no engajamento em processos de expansão do direito e de articulação entre horizontes culturais particulares, e destes com níveis mais abrangentes de pertencimento (SEGATO, 2006).
Como assinala Segato (2006, p. 228), esse compromisso da Antropologia implica em deixar-se interpelar pelas demandas e perspectivas desses grupos historicamente subalternizados, o que se tornou mais premente com a instituição de cotas sociais e raciais no ensino superior, o que possibilitou trazer representantes desses “outros” – integrantes de povos indígenas, afrodescendentes e quilombolas, pessoas oriundas de classes populares, etc. – para dentro dos muros da universidade.
Esses desafios apontados por Segato tornaram-se mais prementes com as políticas de ações afirmativas e processos seletivos especiais para ingresso no ensino superior. Segundo o antropólogo José Jorge de Carvalho, a mudança no perfil dos estudantes universitários só significará um avanço no processo de descolonização acadêmica se for acompanhada pela abertura dessas instituições para os saberes oriundos dos coletivos de onde esses estudantes cotistas provêm. Ou seja, a universidade precisa estar comprometida com uma “[...] formação antirracista, descolonizadora e sensível à diversidade dos saberes não ocidentais criados e reproduzidos pelos negros, indígenas e demais povos tradicionais.” (CARVALHO, 2019, p. 81)
Não abrir as portas da academia para os saberes das comunidades tradicionais e periféricas equivale à uma desqualificação epistêmica desses grupos que hoje possuem integrantes nos bancos universitários, ou seja, equivale à afirmação da superioridade do saber eurocêntrico moderno, situando os estudantes negros, quilombolas, indígenas e de periferias apenas como aprendizes. A refundação da academia, instituída e consolidada a partir de um “paradigma monoepistêmico”, a partir do diálogo com outras formas de saberes e perspectivas de mundo, é fundamental para a constituição de uma universidade pluriepistêmica, pautada no convívio entre princípios diferentes de acesso ao conhecimento, sem que uma forma de conhecer seja necessariamente reduzida aos termos da outra.
[...] Em alguns casos, podemos nos deparar com saberes equivalentes; em outros, serão saberes diferentes, porém complementares; ainda em outros casos, os saberes eurocêntricos e os tradicionais podem mostrar-se incompatíveis. [...] A necessidade de dialogar com os mestres empurrará a universidade para um arranjo transdisciplinar dos saberes, até agora compartimentados, que ela promove através da docência e da pesquisa. [...] (CARVALHO, 2019, p. 97)
Para além dessa possibilidade de encontro de saberes, a atividade extensionista junto a grupos periféricos e tradicionais (ou junto às organizações e instituições que com eles atuem) potencializa um “regime horizontal de troca intelectual e política” (CARVALHO, 2019, p. 103), de forma que determinados segmentos sociais insiram na pauta acadêmica problemas e demandas que efetivamente lhes digam respeito, mesmo quando o almejado é a busca de soluções por meio dos paradigmas vigentes.
Roberto Cardoso de Oliveira (2004) já havia assinalado, alhures, sobre a necessidade do engajamento antropológico na construção do bem-viver dos grupos com os quais se atua, o que estaria inscrito no bojo de uma “antropologia da ação”. O termo “Bem-viver” tem se apresentado, nas últimas décadas, como “un articulador político-discursivo de primer orden” (BLANCO; AGUIAR, 2020, p. 11). No bojo de uma perspectiva de pensamento latino-americana denominada pós-desenvolvimento, e tendo sido forjado a partir de cosmovisões andinas, diz respeito a um conjunto de propostas que buscam articular uma série de movimentos contrahegemônicos, pautados em alguns princípios como: preservação e autonomia sobre os territórios de convivência; consideração da natureza como um sujeito de direitos; valorização dos saberes, memórias, materialidades significativas e manifestações expressivas de coletivos específicos, e os valores, princípios cognitivos e modos de vida que lhes são correlatos; potencialização dos fóruns próprios de tomada de decisões, assim como dos princípios organizacionais e protagonismos intrínsecos a esses coletivos, face às estruturas de poder com as quais interagem; construção de formas dignas de subsistência, pautadas na valorização do trabalho e criatividade, assim como, no comércio justo de produtos produzidos de forma autogestionária; construção de critérios próprios para validar projetos de futuro, sem subjugação à ideologia desenvolvimentista vigente.
Os princípios gerais que alicerçam o paradigma do bem-viver são, por certo, um tanto desafiadores, especialmente em contextos marcados pela desigualdade abismal, tanto econômica como em termos de poder político, como o é o brasileiro. Essa proposta extensionista se coloca, nesse sentido, como um pequeno elo, dentro de uma extensa malha de potenciais articulações entre atores, instituições, organizações e coletivos que promovam projetos de sociedade pautados na equidade e na coexistência da diversidade. É justamente por isso que, ao invés de definir de maneira fechada um público ou organização específica (tal c
Metodologia
Como foi explicitado na Justificativa, o projeto será direcionado para coletivos, instituições, organizações associativas e movimentos sociais constituídos por – ou que tenham sua ação direcionada para – grupos sociais subalternizados, cujos critérios para sua identificação e seleção se apoiarão no conceito de interseccionalidade:
A interseccionalidade é uma conceituação do problema que busca capturar as consequências estruturais e dinâmicas da interação entre dois ou mais eixos da subordinação. Ela trata especificamente da forma pela qual o racismo, o patriarcalismo, a opressão de classe e outros sistemas discriminatórios criam desigualdades básicas que estruturam as posições relativas de mulheres, raças, etnias, classes e outras. (CRENSHAW, 2002, p. 177)
Como sugerido por Cardoso de Oliveira (2000, p. 219), a constituição de comunidades de comunicação (ou de comunidades interculturais) deve ser pautada na intersubjetividade e “fluxo recíproco de ideias”, supondo para isso a construção conjunta sobre a necessidade e direcionamento das propostas de mudanças em uma determinada realidade. Nesse sentido, a etnografia, direcionada uma “antropologia da ação”, se apresenta como um método adequado de abordagem:
Como saber parcial e situado, produzido a partir da proximidade, da interação e do diálogo, a etnografia pode contribuir para o debate público sobre as desigualdades sociais ao produzir um saber científico que respeite as populações vulneráveis em sua condição de sujeitos produtores de saber. (PIMENTEL; PINHO, 2020, p. 13).
A antropologia da ação deve se pautar no “[...] dever de assegurar condições de possibilidade de estabelecimento de acordos livremente negociados entre interlocutores. [...]” (CARDOSO DE OLIVEIRA, 2004, p. 22), processo que precisa ser levado a termo por meio de uma “ética discursiva” direcionada para a “mediação do diálogo intercultural” (Ibid., p. 31). Para que isso seja possível, cumpre a atenção ao perigo da produção de “comunicação distorcida” no interior de uma “comunidade de argumentação”, distorção essa gerada pela imposição das regras discursivas e políticas dos atores que assumem uma posição hegemônica dentro da arena de comunicação (CARDOSO DE OLIVEIRA, 2000).
Estar aberto não apenas a outros saberes, mas também a outros critérios e instâncias de validação do conhecimento, constituídos não apenas a partir da prerrogativa de uma mente pensante desacoplada dos sentidos corporais (BERNARDINO-COSTA, 2018; COLLINS, 2019). Como assinala João Pacheco de Oliveira (2013), em uma contexto marcado por debates sobre as implicações do colonialismo na própria produção da Antropologia, a prática antropológica se desloca da simples observação distanciada e registro de informações para o envolvimento direto em demandas práticas aportadas por seus interlocutores, afinal, o que distingue os antropólogos dos sujeitos pesquisados consiste apenas nas “modalidades de organizar e transmitir o conhecimento” (OLIVEIRA, 2013, p. 52). O pressuposto de neutralidade consiste, nesse sentido, na “...naturalização das relações de dominação entre grupos sociais assimétricos inseridos em um quadro colonial” (Ibid. p. 55).
Obedecendo a esses preceitos metodológicos mais gerais, múltiplas técnicas de potencialização do diálogo poderão ser utilizadas, a depender das problemáticas abordadas, tais como:
- reuniões coletivas ou rodas de conversa junto a grupos e/ou organizações, com dinâmicas específicas, de acordo com o contexto, para fins de conhecimento mútuo e discussão de temas e problemáticas;
- visitas técnicas para acompanhamento e construção de alternativas para situações-problemas, bem como para troca de conhecimentos entre universidade e comunidades;
- reuniões com parceiros, órgãos públicos e organizações não governamentais para discussão e encaminhamento de problemáticas e alternativas;
- organização, em parceria com organizações e lideranças grupais, de eventos (fóruns, feiras, exposições, jornadas, encontros lúdicos, atividades de ajuda mútua, etc.);
- entrevistas abertas e/ou grupos focais, com possível uso audiovisual para registro de problemáticas e/ou recomposição de memórias e saberes;
- promoção de encontros dentro da universidade com portadores de saberes ou representantes políticos desses coletivos, de forma a tornar mais porosas as fronteiras entre esses espaços;
- elaboração de cartilhas ou outros materiais em suporte gráfico, sobre direitos ou temáticas de interesse de grupos específicos;
- oficinas de elaboração de projetos sociais e culturais para grupos específicos, com vistas ao encaminhamento de demandas junto à agências financiadoras ou órgãos públicos; etc.
- oficinas e cursos, ministradas preferencialmente por agentes que já atuam com grupos periféricos e tradicionais, que possam tanto introduzir novos saberes como resignificar e potencializar práticas tradicionais (artesanato, agricultura e pecuária, estética afro, fitoterápicos, beneficiamento de produtos, associativismo/cooperativismo, etc.);
- realização de dinâmicas em escolas da cidade e região, com foco na educação para a diversidade.
A interseccionalidade é uma conceituação do problema que busca capturar as consequências estruturais e dinâmicas da interação entre dois ou mais eixos da subordinação. Ela trata especificamente da forma pela qual o racismo, o patriarcalismo, a opressão de classe e outros sistemas discriminatórios criam desigualdades básicas que estruturam as posições relativas de mulheres, raças, etnias, classes e outras. (CRENSHAW, 2002, p. 177)
Como sugerido por Cardoso de Oliveira (2000, p. 219), a constituição de comunidades de comunicação (ou de comunidades interculturais) deve ser pautada na intersubjetividade e “fluxo recíproco de ideias”, supondo para isso a construção conjunta sobre a necessidade e direcionamento das propostas de mudanças em uma determinada realidade. Nesse sentido, a etnografia, direcionada uma “antropologia da ação”, se apresenta como um método adequado de abordagem:
Como saber parcial e situado, produzido a partir da proximidade, da interação e do diálogo, a etnografia pode contribuir para o debate público sobre as desigualdades sociais ao produzir um saber científico que respeite as populações vulneráveis em sua condição de sujeitos produtores de saber. (PIMENTEL; PINHO, 2020, p. 13).
A antropologia da ação deve se pautar no “[...] dever de assegurar condições de possibilidade de estabelecimento de acordos livremente negociados entre interlocutores. [...]” (CARDOSO DE OLIVEIRA, 2004, p. 22), processo que precisa ser levado a termo por meio de uma “ética discursiva” direcionada para a “mediação do diálogo intercultural” (Ibid., p. 31). Para que isso seja possível, cumpre a atenção ao perigo da produção de “comunicação distorcida” no interior de uma “comunidade de argumentação”, distorção essa gerada pela imposição das regras discursivas e políticas dos atores que assumem uma posição hegemônica dentro da arena de comunicação (CARDOSO DE OLIVEIRA, 2000).
Estar aberto não apenas a outros saberes, mas também a outros critérios e instâncias de validação do conhecimento, constituídos não apenas a partir da prerrogativa de uma mente pensante desacoplada dos sentidos corporais (BERNARDINO-COSTA, 2018; COLLINS, 2019). Como assinala João Pacheco de Oliveira (2013), em uma contexto marcado por debates sobre as implicações do colonialismo na própria produção da Antropologia, a prática antropológica se desloca da simples observação distanciada e registro de informações para o envolvimento direto em demandas práticas aportadas por seus interlocutores, afinal, o que distingue os antropólogos dos sujeitos pesquisados consiste apenas nas “modalidades de organizar e transmitir o conhecimento” (OLIVEIRA, 2013, p. 52). O pressuposto de neutralidade consiste, nesse sentido, na “...naturalização das relações de dominação entre grupos sociais assimétricos inseridos em um quadro colonial” (Ibid. p. 55).
Obedecendo a esses preceitos metodológicos mais gerais, múltiplas técnicas de potencialização do diálogo poderão ser utilizadas, a depender das problemáticas abordadas, tais como:
- reuniões coletivas ou rodas de conversa junto a grupos e/ou organizações, com dinâmicas específicas, de acordo com o contexto, para fins de conhecimento mútuo e discussão de temas e problemáticas;
- visitas técnicas para acompanhamento e construção de alternativas para situações-problemas, bem como para troca de conhecimentos entre universidade e comunidades;
- reuniões com parceiros, órgãos públicos e organizações não governamentais para discussão e encaminhamento de problemáticas e alternativas;
- organização, em parceria com organizações e lideranças grupais, de eventos (fóruns, feiras, exposições, jornadas, encontros lúdicos, atividades de ajuda mútua, etc.);
- entrevistas abertas e/ou grupos focais, com possível uso audiovisual para registro de problemáticas e/ou recomposição de memórias e saberes;
- promoção de encontros dentro da universidade com portadores de saberes ou representantes políticos desses coletivos, de forma a tornar mais porosas as fronteiras entre esses espaços;
- elaboração de cartilhas ou outros materiais em suporte gráfico, sobre direitos ou temáticas de interesse de grupos específicos;
- oficinas de elaboração de projetos sociais e culturais para grupos específicos, com vistas ao encaminhamento de demandas junto à agências financiadoras ou órgãos públicos; etc.
- oficinas e cursos, ministradas preferencialmente por agentes que já atuam com grupos periféricos e tradicionais, que possam tanto introduzir novos saberes como resignificar e potencializar práticas tradicionais (artesanato, agricultura e pecuária, estética afro, fitoterápicos, beneficiamento de produtos, associativismo/cooperativismo, etc.);
- realização de dinâmicas em escolas da cidade e região, com foco na educação para a diversidade.
Indicadores, Metas e Resultados
Como o projeto tem por objetivo respeitar as demandas que os próprios coletivos vierem a apresentar, é difícil esta previsão de resultados. Nos propomos, porém, algumas metas, que pretendemos cumprir até dezembro de 2023, quando serão reelaboradas por ocasião da prorrogação do projeto:
Ação 20200
- rearticular os vínculos dos grupos de artesãs quilombolas Raízes Negras e Maçambique aos Fórum Micro-regional de Economia Solidária, o que foi desestabilizado durante o período pandêmico; assim como, assessorar e consolidar a participação desses grupos na FEMENI – Feira de Mulheres Empreendedoras Negras e Indígenas;
- potencializar a criação de no mínimo mais um grupo de mulheres artesãs quilombolas em comunidade da região;
- potencializar a criação de no mínimo mais um grupo de mulheres artesãs na periferia de Pelotas ou cidade da região;
- acompanhar e assessorar a participação dos grupos de artesãs em no mínimo 6 feiras dentro da universidade.
Ação 20202
- iniciar o diálogo com no mínimo 2 grupos de periferia e/ou associação de bairro da cidade de Pelotas, com a respectiva sistematização de problemáticas e temas nos quais a equipe do projeto poderá contribuir, o que irá se desdobrar, então em atividades vinculadas à outras ações;
- elaborar ou acompanhar no mínimo 2 projetos sociais ou culturais (um desses projetos, já em andamento na comunidade quilombola Nicanor da Luz e financiado pelo Fundo Baobá, e assessorado pela coordenadora da proposta de extensão aqui apresentada) em comunidades tradicionais ou periféricas;
Ação 20205
- finalizar o inventário e organização do acervo de documentos físicos do Clube Cultural Fica Ahi Pra Ir Dizendo, o qual foi iniciado por meio do projeto “Clube Fica Ahi: valorização e reconhecimento do associativismo negro pelotense”, e não foi finalizado em decorrência de: intervenção da sede do Clube pelo Corpo de Bombeiros, em meados de 2019; instauração das medidas sanitárias referentes ao contexto pandêmico, no transcorrer de 2020;
- sistematizar e publicar reconstituição de memória coletiva na comunidade Nicanor da Luz, realizada por meio do projeto de extensão “Etnodesenvolvimento e direitos culturais em comunidades quilombolas e indígenas” e não concluído em razão do contexto pandêmico
- editar e lançar no mínimo um documentário sobre saberes tradicionais em comunidade quilombola;
- fazer no mínimo 6 rodas de conversas dentro da universidade com portadores de saberes ou lideranças comunitárias da cidade e região, atividade que será vinculada à curricularização da extensão;
- realizar no mínimo 6 intervenções em espaços escolares da cidade de Pelotas ou região (Ensino Fundamental ou Médio), em conjunto com portadores de saberes ou expondo sistematizações de memórias realizadas em comunidades quilombolas, com vistas à uma educação para a tolerância e antirracista.
Ação 20200
- rearticular os vínculos dos grupos de artesãs quilombolas Raízes Negras e Maçambique aos Fórum Micro-regional de Economia Solidária, o que foi desestabilizado durante o período pandêmico; assim como, assessorar e consolidar a participação desses grupos na FEMENI – Feira de Mulheres Empreendedoras Negras e Indígenas;
- potencializar a criação de no mínimo mais um grupo de mulheres artesãs quilombolas em comunidade da região;
- potencializar a criação de no mínimo mais um grupo de mulheres artesãs na periferia de Pelotas ou cidade da região;
- acompanhar e assessorar a participação dos grupos de artesãs em no mínimo 6 feiras dentro da universidade.
Ação 20202
- iniciar o diálogo com no mínimo 2 grupos de periferia e/ou associação de bairro da cidade de Pelotas, com a respectiva sistematização de problemáticas e temas nos quais a equipe do projeto poderá contribuir, o que irá se desdobrar, então em atividades vinculadas à outras ações;
- elaborar ou acompanhar no mínimo 2 projetos sociais ou culturais (um desses projetos, já em andamento na comunidade quilombola Nicanor da Luz e financiado pelo Fundo Baobá, e assessorado pela coordenadora da proposta de extensão aqui apresentada) em comunidades tradicionais ou periféricas;
Ação 20205
- finalizar o inventário e organização do acervo de documentos físicos do Clube Cultural Fica Ahi Pra Ir Dizendo, o qual foi iniciado por meio do projeto “Clube Fica Ahi: valorização e reconhecimento do associativismo negro pelotense”, e não foi finalizado em decorrência de: intervenção da sede do Clube pelo Corpo de Bombeiros, em meados de 2019; instauração das medidas sanitárias referentes ao contexto pandêmico, no transcorrer de 2020;
- sistematizar e publicar reconstituição de memória coletiva na comunidade Nicanor da Luz, realizada por meio do projeto de extensão “Etnodesenvolvimento e direitos culturais em comunidades quilombolas e indígenas” e não concluído em razão do contexto pandêmico
- editar e lançar no mínimo um documentário sobre saberes tradicionais em comunidade quilombola;
- fazer no mínimo 6 rodas de conversas dentro da universidade com portadores de saberes ou lideranças comunitárias da cidade e região, atividade que será vinculada à curricularização da extensão;
- realizar no mínimo 6 intervenções em espaços escolares da cidade de Pelotas ou região (Ensino Fundamental ou Médio), em conjunto com portadores de saberes ou expondo sistematizações de memórias realizadas em comunidades quilombolas, com vistas à uma educação para a tolerância e antirracista.
Equipe do Projeto
Nome | CH Semanal | Data inicial | Data final |
---|---|---|---|
ANA PATRÍCIA LIMA DE MEDEIROS | |||
Adão Roberto Xavier Lima | |||
BRUNA DUARTE NUNES | |||
Deiviti Rodrigues Barcelos | |||
Diego Rabelo Nonato | |||
EDUARDA MENSCH | |||
ELISÂNGELA DOS SANTOS BANDEIRA | |||
EVA MARIA DUTRA PINHEIRO | |||
FABIANE RODRIGUES MORAES | |||
FERNANDA DE MEDEIROS CUNHA | 1 | ||
FLAVIA LISE GARCIA | |||
HELENA COSTA DA TRINDADE | |||
JESUALDA MARENGO DE MACEDO | |||
LORI ALTMANN | 2 | ||
LUCAS ANDERSON DE CARVALHO | |||
LUCIANA CUSTÓDIO DE OLIVEIRA ROSA | |||
LUIS OTAVIO COSTA NOYA PENNA | |||
Laís Amélia Ribeiro de Siqueira | |||
MARCUS VINICIUS SPOLLE | 1 | ||
MILENA MENDIONDO DA ROSA | |||
NICOLE PEREIRA XAVIER | |||
PATRÍCIA ANGÉLICA RODRIGUES | |||
PAULO HENRIQUE SEVIDANES JUNIOR | |||
RAFAELLA HERMES LEMOS | |||
ROSANA MARTINS DOS SANTOS | |||
ROSANE APARECIDA RUBERT | 5 | ||
SANDRO LUIS DUARTE MESQUITA | |||
TAIS DA ROSA TEIXEIRA | |||
THAINARA PEREIRA DE SOUZA |