Nome do Projeto
Museus e Patrimônio diante de Catástrofes Climáticas
Ênfase
Pesquisa
Data inicial - Data final
01/06/2025 - 01/06/2029
Unidade de Origem
Coordenador Atual
Área CNPq
Ciências Sociais Aplicadas
Resumo
O estudo pretende analisar a situação dos museus e dos objetos biográficos no Rio Grande do Sul durante e pós-enchentes em 2024. Pretende realizar uma análise vertical da situação local e realizar estudos comparativos com outras situações similares vividas em outros países nesses últimos anos, a fim de compreender a dimensão do fenômeno desde um ponto de vista mais horizontal. Nesse sentido serão pesquisados nesse trabalho as inundações do Rio Grande do Sul de 2024, que afetou muitos museus e comunidades, de Paris em 2016, que ameaçou os museus à margem do rio Sena, também as que ocorreram na região de Emiglia-Romana da Itália em 2023 que ameaçou (e inundou) museus de várias cidades como Ferrara, Florença, Faenza, entre outras e a recente inundação de Valência, na Espanha (2024) que afetou muitos museus locais. Em todos os casos houve mobilização social e política e ações que se seguiram às catástrofes muito semelhantes às ocorridas no Rio Grande do Sul em 2024, entretanto se faz necessário compreender as especificidades de cada situação e as respostas imediatas (Kellermann, 2007) das comunidades locais, tanto em relação às instituições museológicas, quanto em relação a salvaguarda de objetos afetivos, de grande potencial memorial.

Objetivo Geral

Objetivo Geral


O projeto de pesquisa ora apresentado tem como objetivo principal analisar a situação dos museus e dos objetos biográficos diante de situações de catástrofe climáticas, mais precisamente, diante de inundações, como a ocorrida no Rio Grande do Sul em maio de 2024.

Objetivos Específicos:


• Conhecer as ações locais dos museus afetados diante da situação das enchentes no Rio Grande do Sul;
• Estudar situações semelhantes previamente levantadas como as de cidades como Paris, na França (2016); algumas na região de Emiglia Romana, na Itália (2023) e Valência, na Espanha (2024);
• Analisar as respostas políticas diante dessas situações, seja por governos locais, regionais, nacionais;
• Analisar as respostas dos agentes culturais diretamente envolvidos com as instituições museais;
• Analisar as respostas comunitárias e das instituições diante das perdas acervos pessoais atingidos pelas enchentes;
• Buscar compreender musealidade dos objetos pessoais como ativadores de memórias e as consequências de sua perda;
• Analisar o significado dos objetos recuperados e seu potencial memorial-patrimonial tanto em nível pessoal quanto comunitário;
• Compreender como as catástrofes atribuem valor patrimonial aos objetos pessoais transformando-os em testemunhos;
• Mapear as ações e discussões que vem sendo realizadas pelas instituições museológicas em relação aos museus e às catástrofes climáticas.

Justificativa

O projeto aqui apresentado tem como objeto os museus e os objetos afetivos remanescentes de pessoas e comunidades atingidos pela enchente de 2024 no Rio Grande do Sul. O que podem dizer os museus e o patrimônio diante da catástrofe? O que podem fazer diante da catástrofe? O que vêm fazendo diante das catástrofes climáticas, especificamente diante de enchentes e inundações. As ações se limitam às instituições ou o olhar museológico transborda para os objetos pessoais?
A enchente que assolou o Rio Grande do Sul em maio de 2024 colocou a população e as instituições diante de uma grande crise que afetou enormemente a
sociedade, dos 497 municípios gaúchos, 437 foram afetados pela força das águas e deslizamentos de terra, totalizando mais de 1,9 milhão de pessoas impactadas e 337 mil desalojadas, segundo comunicado de 10 de maio da Defesa Civil do Rio Grande do Sul. O recorte aqui proposto trata da situação das instituições museais e de objetos - musealizados ou não – mas com potencial memorial, nesse contexto de catástrofe.
Os séculos XX e agora XXI são marcados por catástrofes, conforme Seligmann-Silva (2008), do ponto de vista das vítimas, toda catástrofe é única. Inúmeros estudos vem tematizando catástrofes históricas como guerras, genocídios, ditaduras, situações de violência extrema e, desde um ponto de vista histórico-memorial-testemunhal, podemos citar autores como Levi (1990; 1998), Seligmann-Silva (2003; 2008), Agambem (1998), Jelín (2002) entre outros que abordam as formas de memorialização e narrativa dos eventos traumáticos. Quando se trata relação entre museus, patrimônio e situações extremas podemos citar os trabalhos de Ferreira (2024) Fleury (2011), Moore (2009), voltados principalmente para museus que apresentam como principal missão serem comunicadores e espaços testemunhais de memórias traumáticas. Esses trabalhos porém, tratam da musealização de situações extremas e não de museus em situações extremas, como o caso de catástrofes.
No Rio Grande do Sul, durante a enchente de maio de 2024 foram realizadas inúmeras ações de salvamento propostas desde o Secretaria Estadual da Cultura-RS, como um mapeamento que identificou que mais de 50 instituições museais teriam sido afetadas no estado, acarretando em perdas de acervos e instituições que foram temporária ou permanentemente fechadas.1 Uma das instituições mais afetadas foi o Museu de Arte do Rio Grande do Sul - MARGS – que voltou a reabrir em dezembro de 2024 com uma exposição para tratar justamente sobre esse período, intitulada “Post scriptum – Um museu como memória”. Outra instituição severamente afetada foi o Museu do Carvão, no município de Arroio dos Ratos, cuja recuperação do acervo ainda está em andamento e conta com parcerias importantes nacionais e internacionais. Um levantamento da situação dos museus e equipamentos culturais atingidos pelas enchentes também foi realizado por um grupo da UNESCO que esteve no Rio Grande do Sul no mês de julho de 20244 Um resultado esperado com a pesquisa é mapear e analisar essas ações.
Além das instituições afetadas, ao devastar cidades inteiras como algumas dos vales dos rios Taquari, Jacuí, Guaíba, Lagoa dos Patos, atingindo municípios como Cruzeiro do Sul, Estrela, Santa Cruz, Santa Tereza, Muçum, Roca Sales, Sinimbu, Arroio dos Ratos, São Leopoldo, Canoas entre outros, as inundações fizeram desaparecer ou danificaram inúmeros objetos afetivos.
Os objetos, assim como os lugares, podem ser considerados, conforme Maurice Halbwachs (1990), como quadros sociais sobre os quais construímos nossas memórias, nesse sentido, a perda material desses lugares/objetos compromete nossas lembranças e identidades. Um dos objetivos da pesquisa é compreender o valor memorial-patrimonial- identitário desses objetos. Aspira-se compreender esse fenômeno e analisar a significado dos objetos na reconstrução das memórias no pós-enchente.
O luto pelos objetos afetivos enunciados em muitas reportagens do período são evidências da importância que os mesmos tem nas trajetórias de vida tanto individuais como de comunidades. Embora não estejam em museus, despertam emoções patrimoniais (FABRE, 2013) e merecem uma análise sob o ponto de vista da musealidade.
Conforme Bruno Brulon, “a musealidade, proposta inicialmente por Stránský, tem a pretensão de cobrir quase todas as qualidades não-materiais do objeto de museu ou do patrimônio cultural em seu sentido amplo (BRULON SOARES, 2018, p.191.), podendo assim ser pensada para esses objetos que constituem restos (DEBARY, 2010).
Em relação aos objetos pessoais, afetados em situações de catástrofe, podemos citar o trabalho de André Silva (2024) sobre os objetos soterrados no desastre da localidade de Bento Rodrigues, vizinha da cidade de Mariana-MG, atingida pelo deslizamento de lama derivado da mineradora SAMARCO em 2015 e sua reconversão em objetos com valor simbólico e patrimonial, o autor mostrou que, cada um dos objetos soterrados no desastre mantinha uma relação afetiva com as vítimas (SILVA, 2024, p. 435). Seguindo esse mesmo sentido, o projeto de pesquisa pretende analisar não somente a museália, ou seja, objetos musealizados (DESVALLÉES; MAIRESSE 2013), mas também objetos que, mesmo não musealiazados, podem ser considerados objetos sociotransmissores, uma vez que transmitem memórias entre indivíduos e sociedade (CANDAU, 2012). Também chamaremos esses objetos, com esse poder de evocação para os indivíduos, de objetos biográficos, seguindo as definições de MORIN (1969) e HOSKINS (2010).
Em síntese, a proposta de pesquisa aqui apresentada tem como objetivo estudar a situação dos museus e dos objetos biográficos-afetivos diante de situações de catástrofe climáticas, mais precisamente, diante dessas inundações, situações extremas cada vez mais comuns em nossa sociedade.

Metodologia

A metodologia a ser utilizada nessa pesquisa tem por base o estudo de caso – a situação dos museus e objetos afetivos – durante e pós-enchente no Rio Grande do Sul de maio de 2024. Também utilizará uma metodologia comparativa com outras realidades onde a ocorrência das catástrofes climáticas afetou museus e objetos pessoais. A pesquisa ocorrerá por meio de trabalho de campo in loco, de modo remoto e no meio digital.
A pesquisa online será o ponto de partida, a partir do acompanhamento das atividades de museus, instituições culturais, grupos de auxílio durante e pós período das enchentes. Serão realizadas entrevistas de forma remota e presencial com pessoas do corpo administrativo das instituições levantadas e grupos organizados com a finalidade de auxílio às instituições e às pessoas afetadas. Serão também analisadas matérias de divulgação e coberturas jornalísticas do período disponíveis na web.
Pretende-se também visitar alguns locais afetados e dialogar diretamente com algumas pessoas atingidas que tiveram seus objetos biográficos ou acervos pessoais afetados ou perdidos nos municípios mais afetados, como Canoas, Cruzeiro do Sul e Sinimbú. Essas visitas a museus e comunidades afetadas serão realizadas a fim de observar in loco as dinâmicas de preservação e recuperação dos acervos e objetos pessoais.
Também serão realizadas entrevistas semi-estruturadas com gestores e profissionais dos museus afetados pelas enchentes no Rio Grande do Sul, agentes culturais envolvidos diretamente com a gestão de acervos em contextos de crise, representantes das comunidades atingidas, com foco na relação afetiva com os objetos perdidos ou recuperados.
Portanto, se trabalhará em duas frentes: uma junto a acervos musealizados, salvaguardados em instituições e outra junto às pessoas que tiveram seus objetos afetivos perdidos na enchente, tanto de forma presencial, quanto remota. Parte-se de algumas situações previamente conhecidas e provavelmente o campo indique outras situações ainda não conhecidas e que serão levantadas e analisadas nessa pesquisa.

Indicadores, Metas e Resultados

Os resultados esperados pela pesquisa são, além de conhecer em profundidade as situações vivenciadas diante dessa catástrofe ocorrida no Rio Grande do Sul em maio de 2024, compreender e analisar as medidas tomadas, os impactos das perdas dos objetos patrimoniais e/ou afetivos para as instituições e pessoas. Considerando que esses eventos estão cada vez mais presentes em nossa sociedade e que as instituições e pessoas terão outras situações semelhantes a fazer frente em um futuro incerto, espera-se que essa pesquisa ajude a compreender essas ocorrências e como desdobramento, auxilie instituições e comunidades.
Outro resultado que espera-se com essa pesquisa é que ela possa contribuir como novos aportes teóricos (e sociais) em relação às respostas imediatas da comunidade diante de situações de desastre, no caso estudado, das enchentes.

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